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03/03/24

Contra Uniformes Ridículos





Hoje o técnico de redes veio em minha casa. Estava uniformizado. Verdadeiro ultraje estético era o uniforme, terrível a desarmonia entre as cores. Fruto provável do sadismo dos ricos em humilhar os pobres. Ou, talvez, uma demanda técnica; a combinação aberrante de cores serviria para torna-lo mais visível. Na certa, só a junção desses dois motivos explicava o uniforme. Humilhar e fazer ver a humilhação.

Preciso da rede digital funcionando, uso-a para conspirar. Faço parte de uma organização clandestina de pessoas que odeiam uniformes ridículos e acham imoral obrigar pais de família, homens de cabelos grisalhos, a vesti-los. Se for para existir uniformes, que se façam belíssimos uniformes, não essas monstruosidades, com calças largas e coloridas, que mais parecem roupas de palhaço.

Era um uniforme feio e eloquente: falava pelo homem. Apesar de minha piedade, a desumanidade do uniforme blindou-me: não enxerguei o homem, o pai de família. Tomei o uniforme pelo homem, achei que um falava pelo outro. Era um trabalhador manual e nada mais que um trabalhador manual. Subidor de escadas, colocador de cabos, medidor de potências, cumpridor de demandas jamais por ele escolhidas. Demandas como a minha. Então desejei que acertasse a rede o mais rápido e fosse embora com seu uniforme ridículo. Via o técnico, não o homem.

Ele e eu na mesma sala, a operação demorando mais que o esperado, resolvi estimular a conversa para me entreter. Nada de interessante eu esperava. Fiquei surpreso, porém, com um comentário. Ele achou estranho um sujeito tão jovem morar sozinho. Divertiu-me essa surpresa. Expliquei minha opção solitária contando como a criação controladora, por pais muito religiosos, tornou-me um individualista cioso de privacidade e liberdade. Contei que mantendo a distância melhorei muito a relação com meus pais. Ele de pronto compreendeu. Vivera a mesma situação com seu pai, talvez pior, já que este era um paraibano alcóolatra.

Dessa mútua compreensão nasceu, entre eu e ele, uma ponte. Caíram-me as escamas dos olhos e pude ver: havia ali um homem e não um uniforme! Era uma mente humana, uma vida humana, cheia de histórias a contar, experiências que eu não tive e jamais terei, crenças que não são as minhas, paixões que desconheço. Desejei, agora animado pela curiosidade psicológica, analisar o espécime. Para isso, usei a teoria controversa: a tese de que pela análise dos gostos musicais é possível derivar todo um perfil psicológico e geracional.

Armei-me com o celular e perguntei se ele gostava de Roberto Carlos. Como disse que não gostava, perguntei que tipo de música ele costumava ouvir. Pergunta arriscada, porque, se ele citasse algum gênero tenebroso, eu não saberia o que fazer. Explicou que gostava mais de músicas internacionais, o que queria dizer "em inglês". Fui nomeando os gêneros e citando bandas representativas, até que chegamos em Nu Metal e Triphop. Mais especificamente, Linkin Park e Gorillaz, que todo mundo ouvia no alvorecer dos anos 2000. Pus a tocar Feel Good Inc, e, enquanto ele trabalhava, apreciávamos e comentávamos curiosidades sobre a canção.

Seu gosto por músicas gringas vinha da experiência como professor de patinação no gelo. Achei a coisa inusitada e estimulei que falasse mais a respeito. Logo ele estava me contando toda a sua jornada no mundo da patinação. Começara sendo patinador de asfalto, depois interessou-se pela patinação no gelo, treinou até virar instrutor num grande shopping. Contou que tinha muita prática, fez notar que era talentoso, falou dos movimentos, da velocidade, dos tipos de patins, dos colegas.

Corpulento e enérgico, enquanto ele falava os seus olhos brilhavam, o tom de voz altíssimo; ele ia criando uma outra ponte, e eu, ao atravessá-la, ganhava naquele momento um novo universo de interesses, possibilidades e fantasias. Parecia divertido, poético e desafiador. Perguntei o que o fez deixar a vida de patinador. Com a voz cheia de sentimento, ele soltou um exaspero e fez retórica:

- Ah, meu amigo, a patinação no gelo... O que aconteceu com a patinação no gelo? Acabou a patinação no gelo!

Quis saber porquê, perguntei onde ainda tinha, qual o preço, indaguei se ele havia transmitido aos filhos o legado dos patins. A sua paixão, o prazer ao falar do assunto; ao rememorar as aventuras, os saltos mortais, os tombos, ele ia assumindo ares de antigo herói da adrenalina esportiva, uma vida muito mais interessante que a de técnico de redes. Falava como quem viveu os tempos de ouro do desporto, o que eu não sei se é preciso, mas acreditei. Fascinado, lamentei não tê-lo conhecido antes. Desejei patinar no gelo ao som extasiante da Valsa Número 2 de Shostakovich.

Antes de sair, sorrindo, cumprimentou-me efusivamente. Duas pontes foram criadas entre este cronista e aquele patinador do gelo.

Quando ele foi embora pus me a refletir. Entrou em minha casa um uniforme ridículo usurpando a auto-expressão de um homem, mas quem saiu foi alguém que nada tinha de ridículo. Saiu dela um poeta de uma arte impopular, distante e por aqui esquecida. Hoje, mais do que nunca, sou contra uniformes ridículos.

                                            

                                                           A poesia da patinação no gelo

23/11/23

Os Cavaleiros da Supervia


Benditos sejam esses meninos
Negros, morenos e favelados
Ousados e destemidos
Que numa noite de Sexta-Feira
Empinam bicicletas coloridas
Nos corredores estreitos
Dos trens cinzas da Supervia

Acordam passageiros adormecidos
Fazem caretas de zombaria
Não temem os vigilantes
Sabem escapar aos fiscais
Meninos espertos e anarquistas
Sonham e nos ensinam a ousar

Com invejável equilíbrio
Tecem proezas no desporto
Como hipistas da nobreza
Ou cavaleiros medievais
Dominam seus cavalos modernos
Feitos de pneus, correntes e ligas de metais

Pouco se importam
Com a apatia do mundo
A vida para eles
Carece de aventura
Brilham esses meninos
Com sua poesia urbana
Sintetizada em ato de vida
Poesia in loco, espontânea

Digo aos meninos
Que são a Gangue dos Empinadores
Eles sorriem, orgulhosos
Depois descem todos na mesma estação
E se reúnem em roda, deliberando
Esta noite, para onde vão?
Que molecagens? Que glórias?
Que descobertas?
Que censuras receberão?

Despeço-me deles e reflito
Penso que não sei viver e não vivo
Nasci velho, cansado, Matusalém enrugado
Mas me inspira essa descoberta incrível
A visão da glória da vida
Neste lugar tão distante de tudo
Sabem viver esses meninos
Negros, morenos e favelados
Ousados, felizes, anarquistas

16/11/23

Lágrimas e Saudades


Ela que não morresse
"Preciso ainda de ti", ele afirmou
Ela lacrimejava, pois não queria partir
Mas engoliu o choro e lhe disse
"Da morte não se pode fugir"
 
Ela estava viva
Cambaleante e fraca
E sofrendo muito
Mas estava viva
 
Até que num 2 de Setembro
Veio o seu último dia
Quando então ela partiu 
Diante da família
 
Lembro-me de sua meiguice
E também de sua fé
Lembro-me de seu sorriso
E também de seu abraço
Lembro-me de tudo
E sinto saudades, e choro

09/11/23

O Apelo do Poeta

  

Moça bonita e fogosa
Que me lê a poesia e a prosa
Faz feliz este poeta
Que mesmo pecador
Quer unir-se ao divino
 
Mostra-me teu paraíso
Que tem lugar bem definido
Está de mim afastado
Bem aí, no teu corpinho
Em recinto entrincheirado
Logo abaixo do teu umbigo...
 

02/11/23

Desfile de Ébano

Negras e amorenadas
Nas quebradas a desfilar
Os cabelos black power
O estilo sarará

Andam cheias de marra
Elevadas pelo empoderamento
Deixam de lado a altivez e sorriem
Quando as elogio o embelezamento

Os corpos muito diversos
Cheios de talentos vários
As bundas, bem torneadas
Os seios, arredondados

Variam elas também
Em tipos de personalidade
Algumas são megeras
Outras são raridade

Algumas apreciam poetas cínicos
Românticos e pervertidos como eu
Outras preferem ascetas
Homens honrados e de Deus

Noto que algumas condenam
Meu apreço à beleza sinuosa
Dizem que meu olhar as oprime
E que não devo enaltecer suas formas

Calo-me então e nada digo
Mas calado fico a imaginar
Aquela morena, meu Deus, toda nua

Vênus a me fascinar!


26/10/23

Minha Aristocracia

Não um rei na barriga
Mas uma corte inteira
Em tumultuoso escarcel
O trono usurpado
Pelo revolucionário menestrel
 
Uma outra aristocracia
Jamais vista até então
Poetas, místicos e filósofos
Vagabundos e anarquistas
No controle da situação
 
Amor, virtude e sacrifício
Eis a ordem do dia
Fazei da tua conduta
O poema mais sublime
A mais bela sinfonia
 
A minha aristocracia
Antes desconhecida
Aqui eu lhes apresento 
Sejam meus súditos leais
E hão de viver a contento

18/10/23

Divina Mente Vazia


Coração romântico
Cabeça filosófica
Combinação maldita
Que só traz a derrota
 
Pensar, não mais!
Buscarei o silêncio
A mente vazia
Oficina do demo
 
Ditado idiota 
Pois nada há que se assemelhe
A tão divina magia
Que é fechar os olhos
E limpar a própria mente
 
Coisa de Deus
E não do Diabo
Pois ao Senhor pertence
O nome mais sagrado
O "yod-he vav-he"
Que na quietude se ouve
Sem ser pronunciado

09/10/23

Estranhíssima Trindade


Habitam em mim 

um bobo

um sábio 

e um bruto


A maioria tolera o bobo,

porque diverte

Alguns toleram o sábio, 

quando ilumina


Já o bruto não é tolerado,

pois aterroriza:

Carrasco, 

filia-me aos perversos

e me escandaliza ante os puros

Acorrenta-me:

a uma espiral de paixões lunares

guerras gratuitas

e devassidões dos sentidos


Quero ceder, devo lutar

Bem maior

supremo e sagrado

É a alma

Coisa linda é ter uma

Mas, infeliz a minha,

porque, fracionada


E mesmo assim

frágil, muito frágil, 

tenho alma 

Sagrada, gloriosa

transcendente

É por ela que continuo, e luto:

Cresça em mim o sábio

ou o bobo;

nunca, jamais, o bruto.


03/05/23

Boba proesia


Escrevo melhor quando estou só
Ouço a angústia gritar
Diz ela com clareza
Importante expressar

Não faço prosa nem poesia
Pois não entendo dessas coisas
Faço aqui coisa nova
Uma invencionice minha
Mistura esquisita que chamo de "proesia"
Coisa novíssima que não é prosa e nem poesia

Faço aqui bobagem pequena
Brincadeira de subletrado com sua pena
Gozação de moço solitário
Que tem na palavra um amigo gregário

Queria agora uma lasciva imunda
Para gastar minha criatividade
Fazendo rimas malucas
Mentiria sem piedade
Diria que a amo
Que aos meus olhos é a mais pura

Ganharia dela talvez um sorriso
Talvez uma negativa ou um gracejo
Mas quereria mesmo é despi-la
Pondo minha boca em seu umbigo


26/04/23

Ideólogo do Amor

 

A palavra vulgar
Que me vem sem cessar
Descreve coisa amiga
A boceta da mulher
Que coisa mais querida!

Palavra que não pode faltar
Sem boceta a poesia vai acabar
Evoco a boceta
Pois há nela beleza

Tinha vergonha de dizer
Que gosto de mulher pelada
De putaria e sacanagem
De gemidos e secreções íntimas
Passou a vergonha
E digo agora

Quero boceta
Proclamo a boceta
Defendo a boceta
Prego a boceta
Sou o rei da boceta
Filósofo da boceta
Ideólogo da boceta

Sou inconformado
Revolucionário
Prego boceta para todos
Boceta limpinha
Cheirosinha
Depiladinha
Bonitinha
E grátis!


12/04/23

Rosa, a vizinha


Não é puta
Não duvido que seja anjo
O corpo de uma rosa
Desproporcional e torta
Quer muito me dar
Mas não transo nem por grana


Bonita por dentro e feia por fora
Feia como bruxa
Mas uma bruxa santa
Feia e virtuosa
Quer muito me dar
Mas não transo nem por grana

Fez salgadinho
Para este vizinho
Boa e caridosa
Queria dar-me era a xota
Aceitei os salgados
Recusei a bichana
Não transo nem por grana

Cumprimenta-me ao sair
Cumprimenta-me ao chegar
A genitália inquieta
Me querendo acolchoar
Mas eu não transo
Não com ela
Não transo nem por grana
E não lhe afano a bichana


05/04/23

Prosa vulgar


Nada demais
A prosa deste incapaz
Falta gramática
Falta estilo
E falta conteúdo também

A poesia é pior ainda
Pobre de rima
Não tem métrica
Coisa sem beleza inaudita

Finge não se importar
Mas não é capaz de aceitar
As muitas mentiras
Que cria com facilidade

Algo na Palavra
Algo grande e nobre
Que merece ser descrito
Pobre de mim
Baixo literato
Tento e não consigo


06/07/22

Ignorância (ou: Poema Paranoico)



Ignorância é força
Liberdade é escravidão
2012 esta chegando e os Anunak retornando
A realidade é manipulada
Então cuidado com o flúor na água

Judeus sionistas governam o mundo!
O Golem ira ressuscitar!
O que foi "Croatoan"?
Alguém pode explicar?

Fraude nas vacinas ?
Forjaram os atentados?
E quanto a viajem à lua?
E quanto aos Et's avistados?

Saint Germain era o demônio!
Jesus esta voltando!
O que realmente significa
O Stonehenge americano?

A Nova Ordem esta a caminho?
Sera que George Wells iria se alegrar?
O mundo entrará em colapso
Quando o petróleo acabar?

Será que do futuro Hiram sabia
Quando fundou a maçonaria?
Ou Weishaupt ousou precisar
Ate onde sua organização iria chegar?

Comunismo é uma mentira!
Capitalismo a solução!
Não acreditem nos ideais
Do Exercito Simbionês de Libertação!

Kennedy alertou
Mas foi assassinado!
Bush julgou Saddam
Mas Bush era o culpado!

Controle a população!
Subverta a educação!
Use subliminares!
Venda alienação!

Onde os fracos não tem vez?
Ou simples realidade?
Jesus Cristo não existiu?
Ou a fraude é o Zeitgeist?

Construímos o mundo em nossas mentes?
Ou somos subjugados pela realidade?
E quanto a viajem no tempo?
O que diz a relatividade?

Onde estão as respostas?
Onde esta a solução?
Por que nunca nos ensinam
Que verdade é ilusão?
Sem resposta, sem salvação
Apenas o caos, a confusão