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04/01/23

Como convencer alguém a acreditar em algo surreal e absurdo

É possível fazer alguém acreditar no que você diz,  mesmo que se trate de inverdades, teorias mirabolantes e surreais. Mas, cuidado, pois sempre depende do nível mental do ouvinte e do contexto. Vamos às explicações:

[Não é só o Frank que manipula seus eleitores. Quase toda autoridade te manipula intencionalmente]

Basicamente, para convencer alguém a aceitar alguma crença absurda (especialmente se ela for falsa) você precisa de três fatores, todos baseados em manipulação de viézes cognitivos.

1.Alegação de Autoridade. Seja ela real ou fictícia. Essa autoridade pode ser sua, expressa em superioridade intelectual, superioridade espiritual, superioridade social, bélica, política, etc. Ou pode ser de outro, com quem você alegue ter tido contato ou de quem seja próximo (ou pode mesmo ser até algum livro ou mesmo uma experiência).

2.Repetição Exaustiva. Mesmo as crenças mais irracionais e absurdas passam a ser aceitas quando repetidas um número suficiente de vezes por um número suficiente de autoridades. (Se uma pessoa tende a não ser crítica sobre algo que acabou de aprender, a consequência natural é que quanto mais ela escute a mesma explicação, mais acredite nela. Crenças também são hábitos condicionados e modelados por reforço.

3.Vantagem Emocional e Apelo à Vaidade. Aqui está uma chave crucial: é preciso que a crença traga alguma vantagem emocional para o seu portador. Ela precisa favorecê-lo em algum sentido. Seja elevando seu ego, seja pacificando seus temores, seja lhe dando coragem, seja oferecendo esperança. (As pessoas tendem a acreditar primeiro no que lhes agrada e parece oportuno e conveniente.)

                             [Ben Linos, mestre da manipulação e da trapaça em Lost]

Tenha em mente que o comportamento humano foi modelado pela evolução e pela cultura para obedecer e seguir líderes (os "alfas"), então existe um forte viés cognitivo para acreditar no que é dito por pessoas em tais posições, daí o fundamento da nossa tendência de crença irracional em autoridades. Sobre isso, vale se informar sobre o famoso Experimento de Milgram

Sobre repetição, pequise a repeito de Goebbels e da propaganda nazista, assim como sobre Edward Bernays e as técnicas da propaganda moderna.

Sobre vantagem emocional, pesquise sobre o "maior 171 do Brasil" Marcelo Nascimento, que enganava pessoas oferecendo benefícios e vantagens absurdas, o que despertava a cobiça das vítimas e lhes atiçava a vaidade, já que se imaginavam muito espertas por conseguirem um negócio tão vantajoso.

Mas cuidado! Não é qualquer público que vai acreditar em qualquer discurso. Pessoas mais inteligentes, mais informadas, mais maliciosas e com senso crítico mais apurado tendem a ser mais criteriosas, mais céticas e a ter uma atitude investigativa quando se deparam com conjuntos de crenças ou afirmações aparentemente absurdas ou que demandam comprovação. Existe um bordão dos céticos que ilustra bem essa disposição crítica/analítica:

"Alegações extraordinárias demandam evidências extraordinárias."

Então, um primeiro passo é fazer uma medição geral das inteligências - a famosa "caça aos trouxas" - e deixar de lado aquelas pessoas que estão bem informadas sobre o assunto ou que são inteligentes e investigativas.

Em outras palavas: tentar convencer um geofísico de que a Terra é plana não é boa ideia. É melhor tentar convencer aquele seu vizinho abobado que se acha um espertalhão, mas todos sabem que é um idiota.

Sobre isso, aprenda com os erros do ex-astrólogo, jornalista, pseudofilósofo e guru da Nova Direita Olavo de Carvalho. Quase todas as vezes em que ele se meteu a desafiar um especialista no assunto, foi ridiculamente humilhado. Vou citar aqui as vezes em que, a meu ver, foram as mais interessantes:

Note que esses episódios constrangedores jamais acontecem dentro da seita olavista, pois, via de regra, Olavo é a pessoa melhor informada em seu bando, que é onde ele sempre é reconhecido como a autoridade suprema, o que o permite manipular os demais. Uma coisa básica que se pode notar em qualquer "olavette" é o culto a personalidade e a erudição do Olavo (sim, ele pode ser vigarista em alguns aspectos, mas é um erudito genuíno).

Olavo consegue convencer seus seguidores de que a Terrra não é redonda, de que Barack Obama não nasceu nos USA, que existe uma conspiração comunista orquestrada pelo Foro de São Paulo, que a Teoria da Relatividade está errada, que Georges Cantor não entendia matemática e que Newton era uma anta. Ele é provavelmente o maior guru, manipulador e mestre da persuasão que o Brasil já teve, o que, evidentemente, me faz ter uma extrema simpatia por ele. Recomendo acompanhá-lo e ficar de olho em suas técnicas e retórica delirante.

Aprenda a mentir, trapacear e bem enganar que o mundo será seu!

                                                                         

                                                                   ***

OBS: Assim como outras postagens deste blog, o texto acima foi originalmente publicado como resposta no site Quora.

11/05/22

O Dia Em Que Eu Percebi Que Era Apenas Um Blogueiro Metido

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— Introdução —

Não é fácil lidar com a realidade, especialmente quando ela nos obriga a reconhecer que nossa posição não é tão lisonjeira quanto gostaríamos. 

Só vem a maturidade quando confrontamos nossas vaidades...

Parte 1 _ Ambiguidade

Sempre me vi de formas diversas e contraditórias ao longo da vida. Tenho meu lado cético, mas também meu lado místico, sou minimamente intelectualizado, mas não chego a ser acadêmico ou cientista; amo ensinar e aprender, mas detesto escola e tenho pavor da carreira de professor; amo as mulheres, mas, desde que uma tentou me atropelar, morro de medo delas.

Por ser uma criatura essencialmente ambígua, fico perplexo quando me deparo com aquelas pessoas com posturas firmes, confiantes, repletas de crenças inabaláveis. Caramba! Como conseguem?

Parte 2 _ Matrix

Nunca fui assim, tenho tanta inveja quanto estranhamento em relação a esse povo. Há certos dias em que acordo, olho para o Merlin (meu gato preto ) e lhe acosso:

“ Confesse, Merlin. Esse mundo é a matrix e você não passa de um dèjá-vu fofinho, pode dizer”.

Então ele dá um miado, como que debochando, e fica me encarando com aqueles olhos amarelos, o que eu evidentemente interpreto como uma confirmação.

“Rá! Eu sabia, esse mundo é a matrix!”

Houve o dia em que fiquei tão fissurado nessa ideia que cheguei a responder, no Quora, explicando um pouco sobre a matrix.

Matrix, de certa forma, pode ser interpretado como a grande metáfora cinematográfica do nosso tempo para as ilusões que fazemos do mundo e de nós mesmos. Ilusões que, via de regra, costumam ser muito importantes para a manutenção da falsa autoimagem que gostamos de construir. Convenientemente falsa, porque a realidade é sempre menos glamorosa que a ficção. Belas mulheres, por exemplo, não soltam peidos na ficção, mas os soltam na realidade (e infelizmente eles não são perfumados).

Mas mesmo que estejamos fadados a nos iludir, felizmente ou infelizmente, os mais autocríticos também estão fadados a perceber e ter que encarar as próprias ilusões. Foi justamente o que aconteceu comigo no dia em que percebi que, longe de ser escritor, eu era mero blogueiro.

Parte 3 _ Pau No C# do Leitor

Há gente que escreve por hobby e sem nenhuma pretensão literária, mas esse não é exatamente o meu caso. Sempre fui polêmico e pretensioso, para o bem ou para o mal. Kafka dizia que um texto deve ser como um soco no estômago. Em outras palavras, deve ser algo que cause alguma reação e impacto no leitor. Não basta dizer uma verdade, as vezes é preciso dizê-la de forma desagradável, e até mesmo leviana. O leitor hoje em dia anda tão entorpecido com literatura best-seller idiota que já perdeu o hábito de refletir, ou mesmo de perceber o quanto a reflexão é importante.

Quando um escritor percebe isso, o dever dele é provocar os leitores, e o escritor pode realizar essa missão dizendo coisas importantes novas e inimagináveis ou dizendo coisas importantes antigas de um jeito novo e inusitado. O importante é incomodar o leitor, não deixá-lo confortável; afinal, um bom leitor é sempre um leitor incomodado, daquele tipo que te enche na caixa de mensagens ou te para na rua para falar alguma coisa daquele seu último texto, nem que seja para meter o malho. (E os bons escritores acham especialmente divertido quando os leitores metem o malho com propriedade).

Parte 4 _ Vaidade Besta

Nesse quesito, provocar a inteligência alheia, provocar reações, em minha recém carreira literária, eu tive algum sucesso, considerável até. Talvez mais sucesso do que um escritor iniciante e metido deveria ter. Tive a sorte de atrair leitores, alguns admiradores, alguns incentivadores e até um certo renome em alguns ambientes. Não quero falar em números, mas imagine ir dormir sendo um blogueiro absolutamente desconhecido e acordar sendo um nome relativamente conhecido numa das maiores plataformas para escritores online.

Foi mais ou menos o que me aconteceu. Um dia eu percebi que minhas iniciativas literárias estavam dando frutos, monetários, inclusive. Não era muita coisa, mas para alguém que achava que iria demorar ao menos uns vinte anos, era muita coisa. E foi então que comecei a querer introduzir um elemento de glamur na coisa. Mas, felizmente, em minha defesa, eu posso culpar uma mulher. Na verdade, duas.

Parte 5_ Golpista Afetivo

Tudo começou numa festa safada numa capital federal. Daquelas festas que as pessoas vão para fazer coisas inconfessáveis com pessoas que nunca viram na vida. E lá estava eu, no auge dos meus vinte e cinco, em minha fase junkie-intelectual, experimentando os prazeres da vida boêmia e da sexualidade desregrada. Conversava com duas loiras lindas, alunas de medicina, e preparava o bote. Conversa vai, conversa vem, uma delas pergunta o que eu faço.

Tecnicamente, na época, eu era um vagabundo profissional, blogueiro, golpista afetivo e psiconauta intelectualizado. Mas eu não respondi com a verdade. O diabo sussurrou a poderosa palavra em meus ouvidos: escritor. Fiquei excitado com aquela possibilidade, me apresentar como um homem de letras, um profissional da palavra, não um iniciante. Nenhuma mulher fica excitada com iniciantes. Não, eu tinha que posar de profissional, de garanhudo literato, e tinha de fazer isso porque era cool, divertido e interessante. E foi o que eu fiz.

Parte 6_ Pacto Com o Tinhoso

Deu certo. E eu peguei as louras. As duas. Assim o pacto com o Diabo foi consolidado. E eu não parei mais. Em qualquer canto que chegasse, dava a carimbada: “escritor”. Como o meu meio social não é o de pessoas letradas (no Brasil nem as classes letradas são realmente letradas), o impacto era fulminante. Todos os olhares se voltavam para mim, todas as atenções. E logo vinham as sugestões: “bem que você poderia escrever um livro sobre isso, ou sobre aquilo”.

Não vou mentir: foi bastante divertido. Mas, para ser franco, algo, em meu íntimo, me incomodava. Pelo simples fato de que, embora eu escreva, ainda não sou um escritor. Nem tenho livro publicado ainda. Sou apenas um blogueiro intelectualizado que conseguiu cativar algum público em alguns ambientes na internet. Blogueiro, futuro escritor. Sou um quase, uma promessa. Se eu terminar meu livro, e publicar, viro escritor. Estreante. Que não é lá grande coisa, mas já é um começo.

Parte 7 _ Blogueiro

“Ué, John, mas blogueiro não é escritor?”

Alguns são, outros não. A maioria não é. Eu não sou. Se for pegar o significado mecânico do termo, então até quem escreve bula de remédio é escritor, pois está escrevendo. Mas se considerarmos o aspecto artístico ou cultural da coisa, ou o caráter intelectual, veremos que nem todo mundo que escreve é, de fato, escritor.

Houve o dia em que percebi isso. Foi o dia em que eu saí da matrix. Foi quando finalmente percebi que só poderia virar um escritor quando reconhecesse que eu sou, por hora, um blogueiro. Um blogueiro interessante e promissor? Talvez. Mas preciso melhorar. Melhorar em muita coisa.

E, claro, preciso terminar o livro que comecei.

Até foi legal fingir que eu era escritor, mas resolvi parar.

Parte 8 _ Escritor Safadinho

É hora de começar a tentar ser um, de fato.

Afinal, ainda há muitas louras, e morenas, e negras, para quem quero me apresentar, e conceder alguns íntimos autógrafos. Se é que vocês me entendem…

30/04/21

Em Defesa do Charlatão — ou: porque Olavo de Carvalho é um mal necessário

 

Em artigo originalmente publicado na (ótima) revista Café Colombo, Joel Pinheiro da Fonseca — mestre em Filosofia, baluarte do EPL e integrante do Partido Novo— ataca com unhas, dentes e argumentos um antigo conhecido e colaborador. O atacado é ninguém menos que Olavo de Carvalho, o famoso Guru da Virgínia.

O senhor Pinheiro, que vem conquistando um público cada vez maior, é figurinha carimbada nos meios liberais. Eu mesmo já fui fã de seu trabalho e devo a ele, entre outros, a possibilidade de, anos atrás, ler in portuguese divergências inteligentes e racionais às falácias histéricas do Guru e de seus asseclas. Coisa que se deu no finado Ad-Hominem, blog do qual Joel fez parte e onde travou duelos intelectuais com seus amigos olavettes. Onde vislumbrei pela primeira vez na internet uma esgrima intelectual jovem, madura e inteligente, sem os vícios, xingamentos e aberrações que tanto vi em outras páginas de esquerda e direita.

Contudo, apesar de minha simpatia para com Pinheiro, farei aqui, dentro das minhas limitações (que são muitas), um esforço em apresentar um sincero ponto de vista divergente do exposto em seu artigo. Tentarei apresentar um ponto de vista que, ao mesmo tempo em que reconhece certo charlatanismo em Olavo, reconhece também os aspectos positivos dele.

Em principio, estou completamente de acordo com a crítica que Joel traça ao ego acachapante, ao aspecto sectário e à afetação de sabedoria mística tão evidentes em Olavo. Como o mestre em filosofia argumenta, para aqueles que estão familiarizados com o modus operandi do Guru, com seu passado sufi-perenialista, com suas frequentes incongruências, com seus erros cabeludos, paranoias, acusações infundadas e absurdos teóricos, nada é mais notório que o fato de se tratar de um sofista bem preparado, empenhando em vencer e influenciar incautos à qualquer custo.

A questão que quero enfatizar, porém, é que embora Olavo possa atrair gente inteligente e racional para perto de si, acredito que ele, como qualquer guru, só é capaz de hipnotizar aquelas pessoas que já querem ser hipnotizadas.

Explico. Acho que Olavo se aproveita do sentimento de devoção religioso e da disposição de crença de centenas de jovens e fiéis católicos, notavelmente ignorantes em filosofia, mas ao mesmo tempo ansiosos para fundamentar suas expectativas religiosas e condenar a plenos pulmões tudo o que destoe de seus dogmas. Assim, Olavo põe no ar a velha ideia medieval de que a “filosofia é serva da teologia” e os fiéis sentem que aderindo ao credo católico-olavético estarão a contemplar a mais sofisticada e profunda das ciências. Aqui, vê-se que Olavo é, acima de tudo, um místico disfarçado de filósofo.

Já o Olavo político, que só é ouvido e levado a sério pelos sectarios fiéis conquistados através da erística místico-filosófica, aparece como uma bizarra síntese de Gurdgieff, Alborghetti, Joseph Mccarthy e Alex Jones. Uma cria autêntica do espírito brasileiro de compor misturas impossíveis.

Para pessoas razoáveis, é difícil levar Olavo de Carvalho a sério depois de ler o que Orlando Fedeli escreveu sobre sua “Gnose Tradicionalista”. Ou depois de saber que ele, Olavo, rejeita a Teoria da Relatividade, defendendo a terra como centro do universo. Ou, ainda, que covardemente desistiu de um debate — que já havia sido marcado — com o vlogger e Biólogo Pirulla. E fica mais difícil quando compararmos seu comportamento de vinte anos atrás ao comportamento que tem hoje. Vê-se que o homem anda cada vez mais paranoico e enfurecido, vendo em todo lugar “agentes não pagos” do KGB.

Por isso, penso, Olavo só é levado a sério por gente desinformada ou fiéis que seriam capazes de levar a sério qualquer irracionalismo, qualquer guru, uma vez que a cosmovisão religiosa é pautada por uma necessidade de crença no absoluto e não pela necessidade de investigação sobre a natureza última da realidade, como é requisito da busca filosófica.

Entretanto, para nós outros — não olavettes em geral — , Olavo aparece como uma figura ímpar que merece ser lida e analisada, que merece ser discutida por quem pode evidenciar com racionalidade e seriedade suas paranoias e equívocos, justamente para desmascará-los. Falo aqui de conhecedores da obra de Olavo que hoje se opõe a ele, como Francisco Razzo, Jorge Velasco, Caio Rossi e o próprio Joel.

Apesar disso, é importante lembrar que não é em tudo que o guru se equivoca. Ouso dizer que há coisas boas na obra olavética. Sem dúvidas, a melhor delas é a diversidade de referências bibliográficas e intelectuais (“a bibliografia arcana” como chamou um amigo). Eu mesmo, por exemplo, conheci o excelente Antônio Paim lendo artigos do Olavo. E sei que muita gente só atentou para autores como Vilém Flusser, J.G. Merquior, Meira Penna, Alan Sokal, Otto Maria Carpeaux, Roger Scruton, Mario Ferreira dos Santos e Vicente Ferreira da Silva depois de ler artigos dele ou de seguidores. Neste caso, ao menos devemos reconhecer que Olavo é eficiente em indicar autores notáveis. Ao menos como propagandista de intelectuais de peso ele presta.

Em segundo plano, como temas relevantes na obra de Olavo, pode-se citar as explanações sobre importância da Filosofia e Educação Clássica; validade de sistemas de ensino como Trivium e Quadrivium; discussões metodológicas sobre o filosofar; discussões sobre a argumentação, a erística e a lógica simbólica; assim como sobre a questão da importância da biografia de determinado filósofo no que se refere ao entendimento de sua filosofia. Tudo isso aparece na obra do guru, as vezes em forma de duelo com intelectuais divergentes. A rigor, tais conteúdos me parecem questões pertinentes e que devem ser discutidas.

Quando o assunto é Olavo, há que se falar também da questão do desenvolvimento intelectual dos indivíduos, coisa que se dá através do fundamental encontro com o erro. Eu mesmo já fui olavette e — quão difícil é confessar! — já andei a ruminar contra o Foro de São Paulo.

Sei que Joel e tantos outros já passaram por essa fase também. E suspeito que se voltarmos um pouco mais no tempo, veremos que provavelmente já fomos também mais inocentes às ideias de esquerda e às armadilhas da vida intelectual como um todo. Agora, um pouco mais preparados, podemos constatar que evoluímos e fomos desenvolvendo, aprimorando, nossa capacidade de juízo. Ora, tal progresso seria completamente impossível se não tivéssemos errado, não é mesmo? Afinal, que é o progresso senão a superação dos erros? Olavo é, creio, um dos erros mais importantes pelos quais devemos passar.

Costumo dizer ao meu irmão que há três passos para se iniciar na vida filosófica e intelectual: O primeiro é refutar o relativismo; o segundo é refutar o marxismo; e o terceiro é refutar o olavismo. Certamente que é uma piada, mas não deixa de ser séria. Creio mesmo que é preciso dialetizar, absorver o que há de bom e depois derrotar a erística olavética. Insisto que para o real investigador do mundo não há outra alternativa: é preciso investigar toda filosofia — ou filodoxia — que reivindique o status de verdade última. 

Puxando sardinha para o meu lado, faço notar que outro tema importante na obra de Olavo é o estímulo ao autodidatismo, aspecto educacional e cognitivo praticamente ignorado no sistema de ensino oficial. Jamais conheci um intelectual de língua portuguesa que desse tanta ênfase à curiosidade intelectual autônoma e espontânea e ao mesmo tempo fosse tão acessível quanto Olavo, e digo isso como um interessado em autodidatismo.

Não que não haja grandes defensores da pedagogia libertária entre os intelectuais brasileiros. Ainda reluzem os nomes de Jaime Cubero e Maurício Tragtenberg entre os expoentes do assunto. Mas, verdade seja dita, nenhum deles possui a mesma acessibilidade que a obra de Olavo.

Vejamos, por exemplo, o meu triste caso. Sou um sujeito pobre, e livro no Brasil é um troço bastante caro. Bibliotecas públicas, para quem mora no interior, são sempre distantes e extremamente precárias. Se desejo me educar, me informar, e então passo a ter contato com a obra de um sujeito preocupado justamente em não se prender a ideia de que educação é algo externo, feita num lugar específico e validada por carimbos oficiais; sendo ainda um sujeito culto e com variadas referências bibliográficas, é óbvio que ele terá papel importante em incentivar minha vida intelectual.

Precisamente o mesmo incentivo que me levou a instruir-me sobre posições outras e chegar até intelectuais como Joel Pinheiro ou mesmo o heterodoxo e interessantíssimo Uriel Irigaray. Nesse aspecto, Olavo está muito a frente dos intelectuais da academia que falam para pessoas que desejam carimbos e ignoram por completo as que estão ávidas por conhecimento. Afinal, porque as pessoas fora da universidade não poderiam buscar se educar e obter um bom nível cultural e humanístico? A falta quase total de consideração aos autodidatas deste país mostra que tal questão nem sequer passa pela cabeça de nossos pedagogos.

De qualquer forma, assuma ou não o Joel, a verdade é que Olavo tem lá suas qualidades, algumas das quais procurei mencionar neste texto. Além disso, Olavo também tem mérito: é o pai espiritual da Nova Direita, sendo uma figura proeminente no novo vigor que recebeu o ambiente intelectual brasileiro, principalmente na internet, particularmente nos últimos dez anos.

Sem dúvidas, é preciso falar sobre ele. Diria ainda que é preciso lê-lo e enfrentá-lo, e até mesmo expô-lo como fez o Marco Antônio Villa, como o próprio Joel está a fazer agora.

Enfim, digo com todas as letras: até que apareça um intelectual popular, realmente culto e bem mais simpático, o Guru da Virgínia será um mal necessário. E os que, como Joel, Uriel e Razzo, conseguirem passar por ele, certamente sairão fortalecidos e poderão contribuir intelectualmente, confrontado as incongruências do guru e abrindo os olhos das pessoas.