Bom, vamos lá. Comecemos com um exercício mental:
Imagine que você é uma pessoa curiosa, cheia de energia, fascinada por coisas novas, com uma dose elevada de humor e vontade enorme de se divertir. Em suma: se imagine como uma criança.
Imagine agora que seus pais lhe digam que você poderá ir no maior parque de diversões multitemático do mundo e desfrutar dos melhores brinquedos, quantas vezes quiser. Mas que você precisa seguir as regras de uma autoridade: o senhor Alfredo, seu mestre-guia acompanhante.
Imagine, ao viajar para o parque com o mestre-guia, que você descobre que os dois vão precisar lidar com três problemas pricipais:
- Só é possível visitar os brinquedos a pé, sendo que eles ficam muito longe uns dos outros.
- Vocês tem apenas 5 horas para aproveitar o parque
- E acompanhando vocês há mais umas vinte crianças, todas elas barulhentas, cheias de energia, curiosidade, bom humor e doidas para ir a lugares do parque pelos quais você não tem o menor interesse.
Agora imagine que o senhor Alfredo já visitou o parque tantas e tantas vezes, com tantas crianças ("diabinhos barulhentos" é como ele os chama mentalmente), ao longo de tantos anos, tendo que dar sempre as mesmas respostas sobre os brinquedos, que ele não aguenta mais esse lugar- e nem as crianças. Quando começou, é verdade que ele era jovem e adorava. Mas depois de dez anos fazendo isso, sendo mal remunerado e sem os incentivos adequados, tudo que ele quer é acabar logo esta maldita tarefa e poder ir para casa assistir La Casa de Papel no Netflix.
Para você, a visita é um prazer em potencial, por tudo que ela oferece a sua imaginação e vontade de descoberta e divertimento, mas para o senhor Alfredo é uma obrigação angustiante e um tanto quanto irritante.
Agora, pior, considere que o senhor Alfredo tem um problema de saúde nas pernas, que incham e doem calorosamente quando ele anda por muito tempo.
Agora imagine que o esquema de visita acompanhada consiste em levar você e as outras crianças para uma sala mal arejada, com cores horríveis, acústica pior ainda e mostrar fotos e vídeos desbotados e antigos de como era o parque há 10 anos atrás, assim como dos brinquedos mais próximos (nenhum deles muito interessantes para você) que vocês podem visitar.
Das 5 horas disponíveis, 3 o senhor Alfredo passa com você e seus amigos barulhentos na sala mal arejada, a quarta ele gasta para aplicar uma prova sobre o que ele ensinou na sala mal arejada e a última hora ele gasta permitindo que vocês andem um pouco, jundo dele, e experimentem um brinquedo pelo qual você não tem o menor interesse.
Conseguiu imaginar?
Pois então, depois de repetir essa experiência cem vezes, como você iria se sentir em relação a ideia de visitar o parque com o mestre-guia? Se sentiria animado ou completamente traumatizado e desinteressado, já que sempre foi uma experiência tediosa, limitadora e frustrante?
Bom, essa historinha, a meu ver, é perfeita para explicar o nosso sistema de ensino e os porquês do fracasso retumbante que ele reverbera com êxito em quase todos os seus aspectos. O parque de diversões multitemático representa o conhecimento e as milhares de possibilidades incríveis que ele enseja.
Note que, por natureza, crianças são enérgicas e ficam elétricas diante de um mundo inteiro de possibilidades, coisas novas, animais, cheiros, formas, máquinas, pessoas, brincadeiras, coisas para fazer e para investigar. O mundo lhes oferece uma riqueza fabulosa onde elas mesmas podem decidir o que lhes interessa investigar.
Basta pôr uma criança num Museu, numa Biblioteca ou dar a ela um jogo, ou desafio, que você verá como ela vai, naturalmente, sendo guiada por sua curiosidade e interesse em descobrir coisas e resolver problemas. Nessas situações, vai acontecer da criança ficar tão fascinada com algo que vai imediatamente te perguntar o que é, o que significa e como funciona, aí é justamente quando a curiosidade levou à necessidade de compreensão.
Esse tipo de experiência: o prazer da dúvida, do contato com o misterioso, da descoberta, é o que move a curiosidade natural e resulta na necessidade de compreender, apreender e resolver problemas, ou seja: é a base do amor ao conhecimento. É o que move cientistas, intelectuais, investigadores, filósofos e inventores. É o que move meu autodidatismo e minha paixão em aprender coisas interessantes e resolver problemas que são importantes para mim.
E, bom, a escola mata isso. Estraçalha, na verdade.
Na escola tudo já vem pronto: o que estudar, o como estudar, o onde estudar, o quando estudar e o com quem estudar. Não existe espaço para inovação, arte e criatividade. As matérias são divididas artificialmente, como se no mundo real não houvesse conexão entre Matemática e Português ou Matemática e História, ou seja: como os brinquedos do parque, estão distantes umas das outras.
Assim, mesmo que uma criança possa ser curiosa, a má abordagem de um professor ou de um livro sobre o assunto pode parecer a ela bem menos interessante do que, por exemplo, uma visita ao zoológico ou uma interação com outro grupo de crianças, tão divertidas, curiosas e animadas quanto ela.
Tudo o que a escola requer da criança é a obediência bovina e respostas condicionadas, ou seja: conformação. Quando na verdade a função de um bom mestre deveria ser guiar a curiosidade da criança para apresentar a ela novos universos, nunca sufocar o interesse, as habilidades e gostos pessoais para lhe oferecer a mesma fórmula oferecida a todas as outras.
Como o mestre-guia da metáfora, a maioria dos professores são descontentes, doentes (alguns com sérios transtornos psicológicos), frustrados e tem um domínio quetionável sobre sua matérias, um método sofrível e uma exposição mais questionável ainda.
Ora, agora pense bem: Que tipo de criança ou adolecente vai achar emocionante e inspirador ficar trancado entre quatro paredes, copiando textos e olhando para videos e imagens antigas enquanto escuta a voz monótona de um professor frustrado? Ainda mais quando lá fora tanto as pessoas quanto as coisas parece mais vivas, mais autênticas, mais desafiadoras, mais apaixonantes e mais interessantes!
Em suma: a escola, e seu esquema padrão de ensino, é chata, desinteressante, morta, cafona e limitadora. Enquanto o mundo e os desafios não. É por isso que as crianças preferem os esportes, os jogos e qualquer expansão de contato com o mundo por meio de viajens a lugares desconhecidos.
Jamais esqueça que foi justamente nesse sistema de ensino, que é o mesmo até hoje, que Einsten ouviu de um professor que "nunca chegaria a ser alguém".
Não precisa dizer mais, precisa?
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Nota do editor: a resposta acima foi originalmente publicada no Quora em 2019. Até a presente data teve mais de 7 mil visualizações, 257 votos positivos, 23 comentários e 14 compartilhamentos. Entre os comentaristas da resposta uns concordaram e outros discordaram. Um deles, no entanto, trouxe relato que, pela força da verdade que carrega, urge compartilhar: