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09/03/22

Diálogo da Origem


 


Há muito tempo atrás, antes do primeiro hominídeo caminhar sobre a terra, diante da imensidão do cosmo, dois seres conversavam...

  – Sinto-me entediado, desabafou o primeiro.

 – Compreendo-te, meu amigo... que achas de criarmos vida novamente? Sugeriu o segundo.

 – Outros dinossauros?

 – Não. Creio que podemos ser mais inventivos, explicou.

 – Tens razão. Tenho então uma ideia: que pensas de dotarmos de uma pequena parcela de consciência a nossa criação? Propôs o ser.

 – Acho que seria demasiado interessante. Assim sendo, realizemos então uma aposta.

 – E qual seria ?

 – Aquele que conquistar mais vidas se fará o maior dentre nós.

 – Ótima ideia! Exclamou o primeiro.

   Por fim, um deles perguntou:

 – Como será o teu nome?

 – Diabo, respondeu o outro. E o teu?

 – Será Deus.

 – E qual será o nome de nossa criação?

   Fez-se silêncio. Então a primeira criança fitou a segunda, e disse:

 – Chamemos de homem.

23/02/22

A Besta Que Subiu do Mar

 



Ouvi dizerem que uma grande besta destruiria este planeta. Ouvi que ela surgiria da água e que dominaria, com o passar do tempo, todas as outras formas de vida. Foi dito que empregaria uma magia  tão poderosa que a levaria a alturas e profundidades impossíveis.

Disseram-me que tal besta seria tão astuta quanto a serpente e tão cruel quanto o Demônio. 
Todavia, disseram-me também que ela, a grande e terrível besta, não teria consciência de sua perversidade, que seria vítima de si mesma. Disseram-me que tal criatura, em sua miséria e ignorância, julgar-se-ia inocente dos males que traria ao mundo.

Mas isso foi apenas o que me contaram - uma estória

O que não me contaram é que a besta, de fato, é real, e que já nos dias de hoje anda a dominar o mundo. 

O que não me contaram é que a besta, a terrível besta, não seria chamada "besta" ou "aberração", mas , vaidosa, reconheceria-se em  um curioso e inusitado nome: homo sapiens sapiens.

16/02/22

O Que Mais O Amedrontava

   


A verdade era uma só: ele tinha medo. Era isso o que sentia todas as vezes quando saia às ruas. Tinha medo deles. Tinha medo de suas leis, de seus chefes, de suas mentiras, de seus exércitos, de suas religiões, governos e ciências. Por isso pensou em ir para as montanhas, para as cavernas, para o mato. Mas o procurariam lá, ele sabia. Trariam holofotes e iriam fotografá-lo, fariam reportagens, contariam sua historia em jornais e logo ele ficaria famoso. Então iriam visitá-lo, tratá-lo como aberração e talvez alguns até o seguissem.

Ele pensava nestas coisas e seus olhos lacrimejavam. Os homens, que doença os teria dominado? Que loucura era esta a deles? não sabia. Só sabia que era de todo cruel e perturbadora. Ele pensou que não se poderia fugir deles, por que tinham tomado todo o globo para si. Assustava-lhe a natureza virótica que a raça emanava. Haviam chegado aos 7 bilhões, ele bem sabia. Vejam só, criaram números para medir seus bens e riquezas mas não haviam números para medir sua ignorância, para a sua miséria, para a sua vergonha. Lembrou-se daqueles por quem nutria alguma admiração e respeito. Aqueles que ousaram ensinar, que ousaram pensar, aqueles que foram por eles reconhecidos como sábios e iluminados. "Sempre idolatrados mas nunca escutados" disse de si para si. E pensou no quanto isto era assustador.

De certo modo, isto o enchia de medo, de pavor. Então ele continuava, como há muito, cabisbaixo e deprimido, com Deus e com os homens. Olhava a si no espelho num impulso qualquer de autopiedade e ali detinha-se e se assustava ainda mais. Era talvez aquilo que mais lhe causava sofrimento, pesar e amargura. Olhar-se no espelho, ver a si e saber que todos aqueles que tinham feito de um mundo maravilhoso um mundo que só se podia expressar com lamúrias e prantos, todos aqueles que se poderiam em perfeita coerência chamar de 'virus humanidade' eram, cada membro, exatamente como ele. Isto o fazia chorar. Isto lhe fazia por inteiro amedrontado.