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17/05/22

Notinha #4: Quatro Anos e Vinte e Sete Notas Depois

Notinha pra não passar batido. Evento da vida afetiva: Morte. Morte Simbólica. Moça que já me foi da maior importância e que, refém do curso da vida, perdeu o significado. Há anos, tinha todo e total; hoje já não tem nenhum (o que poderia ter ela fez questão de jogar fora). Memória específica que me causa algum embaraço e crescente indiferença. Curiosidade autobiográfica. Ironia da vida. Notinha de rodapé.

Amei-a no passado e - sempre no passado-  desfrutei a lascívia de seus florescentes anos de beleza e ardor juvenil. Foram quase quatro anos entre o chororô e o nheco-nheco. Fiz planos. Deu em nada, tudo pelo ralo. Motivos muitos. Diferenças muitas. Insuperáveis. Culpa minha. Culpa dela. Passou o tempo e a lembrança deixou gosto amargo, passou mais tempo e passou também o gosto amargo. Hoje: gosto nenhum na boca, apenas espanto e perplexidade diante da efemeridade de alguns votos e afetos. Hoje: ela me despreza, o que é provavelmente o melhor que já me aconteceu. (Ao menos a mantém afastada).

Curiosos, estranhos, imprevisíveis os rumos desta vida. 

Durante quatro anos, tal memória rendeu-me vinte e sete notas (o dobro, talvez, se incluir as contidas em cadernos físicos, e mais um tanto caso incluia os e-mails não enviados); na verdade: bem mais que vinte e sete notas. 50, talvez. Talvez mais. Escrevi o suficiente. Agora passou a vontade, passou a inquietação.

Notinha última esta, para fins de registro apenas.

02/01/22

Lucas Fez Contato: Breve Nota Sobre o Meu Amigo Mais Descolado

A foto do Lucas que capturou um interessante período de nossas vidas.

Fotógrafo e mestre em historia da arte, Lucas Lopes está entre os amigos que mais invejei. Um dos meus  mais longevos camaradas, a origem de nossa amizade deu-se há muitos anos numa divertida turma de oitava série. A paixão por rock, cinema, terror e contracultura nos uniu; assim como nossa sensibilidade melancólica, ou existencialista. Veio dele o primeiro CD do System of a Down que eu ouvi na vida. Sempre gentil, Lucas emprestou-me até o discman para que eu ouvisse o cd. Era 2006 e eu o achava muito descolado por ter um discman, além disso, simpatizava com seu estilo grunge, de cabelos grandes e desgrenhados, vez ou outra declamando alguma frase triste de Kurt Cobain.

Branco, de olhos claros, volumosos cabelos negros, lábios de um vermelho incisivo, olhar sereno, corpo magro e esbelto, deve ter quase um metro e setenta e cinco de altura. Seu rosto, fino e alongado, lembra um pouco o do escritor Robert Louis Stenvenson. Sua aparência, que sugere um perfil de modelo ou ator, sempre encantou as meninas. Daí parte de minha inveja, já que era impossível vencê-lo na arte de encantar as fêmeas. E, de fato, o safado abocanhou algumas meninas com quem eu gostaria de ter ficado, incluindo a bela e badalada Miss R.... Apesar da inveja, nunca levei para o lado pessoal. Não se pode ter tudo, afinal.

Desde os tempos do ensino fundamental continuamos amigos, travando contato as vezes mais e as vezes menos. Acho curioso notar que nosso desenvolvimento pessoal ocorreu por vias contrárias. Enquanto eu tornava-me cada vez mais ressentido, antissocial e arrogante intelectualmente, Lucas tornava-se cada vez mais aberto, humilde e acessível. Enquanto eu permanecia trancado em meu quarto cultuando filósofos mortos, Lucas desbravava o mundo, cultivando as pessoas legais e artísticas que existem nele. Sempre que nos encontrávamos eu ficava admirado com a popularidade e o carisma de meu amigo, que eu percebia pela quantidade de pessoas interessantes que o cercavam. Apesar disso, na maior parte do tempo eu desprezava sua abertura social. Apesar de bom leitor, Lucas não era tão intelectualizado quanto eu - ele era um hipster, e eu um projeto de intelectual diletante - ou ao menos era o que eu pensava, e por esse raciocínio eu concluía que para ele era mais fácil socializar com não-literatos e "cult-bacaninhas". (Na época, não me passava pela cabeça que o nível intelectual não é o melhor critério para julgar as pessoas. Eu realmente achava que era.)

Lucas e eu numa foto improvisada, num momento lúdico-canábico, há oito ou nove anos.

Hoje eu sei perfeitamente bem que a abertura social é uma das melhores qualidades de meu amigo, e que isso lhe proporcionou  muitas  experiências interessantes com gente diversa. Qualidade que aprendi a admirar e invejar. 

Por vezes noto certa atmosfera de mistério em meu amigo, algo difícil de descrever... Sempre achei que ele tinha algo de melancólico, não digo depressivo, mas uma aura de solidão resignada, com certo ar de nouvelle vague, apesar de vê-lo muito mais sociável e melhor integrado. Posso estar errado, mas parece que há um sentimento nele... Algo profundo e doloroso que eu não sei o que é. Impressão que faz lembrar a frase de Cobain que ele costumava citar: "Se meus olhos mostrassem minha alma, todos, ao me verem sorrir, chorariam comigo".

Eu e Lucas vivemos algumas boas aventuras juntos (uma delas foi acampar com amigos em comum). A última vez que o vi foi no início de 2019. Como eu visitava o Rio de Janeiro, marcamos encontro na casa do Matheus Antunes, um velho amigo em comum, aproveitando a ocasião para reunir alguns membros de nossa antiga gangue juvenil, os "Pés Pretos". Foi uma divertida noite, regada a boas substâncias ilícitas, bom álcool, boa conversa, sentimentos nostálgicos e boas músicas. Infelizmente, meu contato com Lucas arrefeceu consideravelmente nos últimos tempos, em parte porque passei anos morando em outro estado (Brasília) e em parte devido a escolhas naturais que nos levaram a caminhos distintos, o imprevisível fluxo da vida. Mas a amizade continua. Quem tem um bom amigo sabe como é: o respeito e o carinho permanece mesmo quando a frequência do contato se vai.

Em fins de 2021, uma grande surpresa: Lucas, que tem redes sociais mas raramente as usa, enviou enorme texto a um de meus perfis no Facebook. Com sua prosa poética e intimista, o amigo trazia sua perplexidade diante da vida, mandava um abraço e denunciava sua saudade. Foi inesperado mas ótimo presente de fim de ano. Uma dessas boas surpresas que a vida traz, e ótima oportunidade para retomar o contato.

15/11/21

Xixizinho Literário Para Não Dizer que Abandonei o Blog


"Não olhem, senão eu não consigo"

Havia esquecido da possibilidade de escrever neste blog. Justifico explicando que tenho dificuldade de gerenciar postagens nos vários blogs e plataformas em que publico. Não que eu tenha publicado muito ultimamente. Para dizer a verdade, nem em meus diários tenho escrito muito...

"Escrever é como fazer xixi. Dá vontade, você vai lá e faz, aí passa. Depois de algum tempo dá vontade de novo". Foi o que disse Paulo Lins, o premiado autor de "Cidade de Deus". Na minha experiência de escrevinhador - um escritor menor, menor, menor - a coisa é bem desse jeitinho, cheia de flutuações. É claro que podem pensar que isso tem a ver com o humor de certos escritores, frequentemente acusados, com razão, de serem excessivamente volúveis.

Nesse time - o dos escritores sem ânimo - há os que escrevem espaçadamente, os que vão escrevendo cada vez menos e os que repentinamente desistem da Literatura. O caso repentino mais célebre e comentado é o de Raduan Nassar (autor que, aliás, eu devo reler em algum momento). Um que jamais levou o próprio texto a sério - talvez com razão - foi Ivan Lessa. Quando publicou, só o fez por insistêcia de seus amigos, especialmente Diogo Mainardi. Radical foi Herberto Salles, que teria queimado o próprio romance. Por sorte, uma versão enviada a um amigo sobreviveu e foi publicada.

Caso menos conhecido, mas também emblemático, é o do meu amigo Wanderson Duke Ramalho, ex-jornalista cultural que escrevia para o CineZenCultural e para o OutrasRotinas. A resolução de Wanderson surpreendeu-me. Pensando melhor, não sei se foi bem uma resolução ou se foi algo inesperado que acabou acontecendo. Wanderson é militar - conheci-o numa escola da Marinha - e sei que os meios militares não são exatamente os tipos mais cultos e letrados. Embora seja muito bem casado com a culta Hosana, acho que o meu amigo não recebia muitos estímulos para escrever. Não, ao menos, de seu meio mais imediato. Aparentemente, contrariando a própria premissa que dá nome a seu blog, Wanderson caiu na rotina iletrada da vida do trabalhador brasileiro.

Ele não foi o único. Darlan Grossi, nosso amigo em comum, artista e blogueiro que chegou a ter texto incluído em coletânea da FluPensa, também não escreve mais. Darlan também é militar e também é casado. Alguém notou o padrão? O meu palpite é de ambos foram absorvidos pelas rotinas da vida burocrática e assim a vida contemplativa, literária e descompromissada foi perdendo lugar. Hoje em dia são homens sérios, de família e respeitáveis, não os vagabundos ébrios e românticos dos nossos tempos de escola militar. Mas já não escrevem. Como poderia um homem sério escrever literatices?

Eu, por outro lado, ainda escrevo. E até, vejam só!, sofro apoio e pressão da família para escrever. Querem porque querem que eu escreva um livro. Estão certos. Escritor sem livro não é escritor. Há anos sonho com a possibilidade de dar o golpe e magicamente mudar minha alcunha de "blogueiro" para "escritor". Ual, fico excitado e eriçado só de pensar nas mocinhas me chamando de escritor. Sim, vaidade, eu sei. Mas é pura verdade e é a vaidade de todos os semiletrados, especialmente os mais pretenciosos como eu.

Tenho que escrever. É o que decidi fazer, afinal. É o que gosto e o que consigo. Pretendo adquirir alguma outra habilidade, especialmente uma que me dê dinheiro e me agrade. Assim conseguirei sobreviver, comprar meus livros e escrever o que der na telha.

E é assim, com estas reflexões mixurucas, que volto a fazer-me presente neste blogzinho sem leitores. Felizmente este blog foi pensado para ser livre e me deixar à vontade, o que permite textos de natureza mais crônica e pessoal. 

É apenas um xixizinho, digamos assim. Por hora, esse é o caminho mais prático. Melhor isso do que nada.

13/05/21

Do F.A.R.R.A ao QUORA: ativismo cultural, opinião e debates na Web

Internet: o mundo em um clique; a loucura em dois.

 Era uma vez um jovem internauta...

Ainda na pré-adolescência, período de meus primeiros acessos, imaginava que a rede mundial de computadores poderia ser interessante fonte de conhecimento e de contatos. E então, tratei de explorá-la.
 
Na época, descobrir blogs e arranjar debates em fóruns eram algumas das coisas mais legais a se fazer. O Youtube estava engatinhando. O Facebook nem havia chegado aqui, e nem precisava: tínhamos o Orkut. Usávamos, para socialização básica e paquera, o MSN (melhor que os “mensageiros” populares de hoje).
 
As Comunidades e os  Interesses...

A opinião independente rolava solta no Orkut, nos blogs e nos fóruns. Tínhamos nós - os nerds, os supercuriosos, os inconformistas, os fazedores de mídia alternativa e os marginalmente intelectualizados – um paraíso artificial.
 
Os  paranoicos acessavam o Fórum Anti Nova Ordem Mundial. Os esotéricos tinham o Teoria da Conspiração. Os satanistas, anarquistas e experimentalistas frequentavam o Morte Súbita Inc – cujo lema era “segredos proibidos ao alcance de todos”- que ensinava desde hipnose até magia sexual até como fazer pactos com demônios. Os céticos acessavam o Ceticismo Aberto, certamente o maior portal do tipo. Os masculinistas se reuniam no Fórum do Búfalo e também em outros, menores, dedicados ao “Realismo”, movimento que problematiza o comportamento feminino e as interações homem-mulher. E os nerds da cultura tinham o F.A.R.RAFórum dos Revolucionários da Rapadura Açucarada.

A Farra Contagiante...

O F.A.R.R.A era basicamente uma universidade nerd. Sua equipe, que contava com voluntários do Brasil inteiro, traduzia e disponibilizava filmes raros, documentários, animes, desenhos, séries antigas, quadrinhos e mangás ainda não publicados no Brasil. Além disso, lá haviam os debates, as recomendações, os classificados, as conversas e os vários projetos internos. O projeto mais duradouro foi a revista: FARRAZINE. Teve mais de vinte edições. Era um fanzine online divertidíssimo, que continuou mesmo depois da derrocada do fórum, em 2009. Os membros, os mais variados: advogados, professores, tatuadores, desenhistas, roteiristas, escritores, artistas, programadores, donas de casa...
 
Se não me engano, era gente do F.A.R.RA que estava por trás do excelente site VERTIGEMHQ, que traduzia e disponibilizava quadrinhos adultos e alternativos, especialmente os da Vertigo, a famosa linha de quadrinhos adultos da DC comics. O F.A.R.R.A era um mundo alternativo. Seus membros eram piratas da cultura. Todos lá amavam o Pirate Bay e o Wikileaks. Não havia um membro que não entendesse como o acesso à internet poderia educar o público e revolucionar o mundo. Foi uma pequena utopia. Infelizmente, faz mais de dez anos que acabou. Deixou-me órfão. Nunca me recuperei.
 
Junto com o Fórum dos Revolucionários da Rapadura Açucarada morreram inúmeros grandes sites e portais de upload e download; o mais memorável, talvez, foi o Rapshare. Morreram, mas não de morte natural. A verdade é que foram assassinados, perseguidos e denunciados por lobistas e advogados de grandes corporações da indústria cultural.
 
O Monstro Corporativo...

Foi a burocracia restritiva do capitalismo digital que matou nossa utopia. O mesmo sistema que, em alguns anos, iria transformar a internet.  Foi ele que impulsionou as redes sociais mais populares, herdeiras do modo Zuckerberg de fazer startup, todas elas moldadas pelos mesmos gatilhos psicológicos de recompensa viciante, fizeram a cabeça – e o comportamento – das novas gerações de usuários. Tudo financiado e possibilitado pelo assanhamento dos anunciantes. Essas plataformas andam deixando muita gente ansiosa, depressiva e suicida, mas isso é detalhe, importante mesmo é o lucro. Capitalismo, onde quer que se encontre, é sempre a mesma história: o monstro corporativo tentando manter nossos olhos vendados e influenciar nosso comportamento consumidor. E sabem qual é o pior? O monstro corporativo sempre vence no final. Ou quase.
 
Hoje em dia ainda há algum pensamento livre na internet. E para ironia do destino, grande parte dele se dá em fóruns ou comunidades frequentemente acusadas de racismo ou antissemitismo, como o Reddit e alguns Chans. Os blogs ainda vivem, mas já não tão vivos quanto antes. O nascimento do Bitchute e do Mastodon, coisa de alguns anos atrás, parece uma lufada de ar fresco. O Pirate Bay permanece, cambaleante, mas ainda lá. O Wikileaks eu nem sei como vai, mas o futuro de Assange não é nada promissor: já foi pego e já foi torturado. Se o deixarem viver, jamais será o mesmo.
 

Algo Errado Com o Quora...

E neste mundo, onde uns querem controlar nossa mente e uns  poucos querem livrá-la, há o Quora. Quando entrei no Quora, vi logo o potencial da plataforma. Parecia um espaço promissor. Dois anos de uso, contudo, me fazem pensar  que algo deu errado. A qualidade do conteúdo, tanto das perguntas como das respostas, decaiu bastante. Não há qualquer tipo de recompensa para as boas iniciativas e para as respostas mais profundas e informativas. O viés dos moderadores é óbvio e incômodo. Alguns usuários mais críticos ou sarcásticos frequentemente se veem com respostas excluídas, sem justificações satisfatórias por parte dos moderadores.
 
E embora tudo isso seja relativamente fácil de resolver, nada indica que será resolvido. Eu mesmo, embora seja tido como rebelde e provocador, resignei-me tanto que já não escrevo por lá. A ideia de que uma ou outra resposta, mesmo quando nitidamente humorística, possa ser apagada tende a me desanimar. E se for para escrever um texto mais trabalhoso e profundo, a sensação é de que o local não é adequado: terá poucas visualizações e poucos comentários. Melhor compartilhar em algum grupo de Facebook, no Medium, num blog ou em algum fórum. Ou, talvez, numa Newsletter. Não no Quora. O Quora é para curiosidades, gracejos moderados e textos menos exigentes.
 
Tudo muda por aqui...

Plataformas que inovam e que se vão, sites e aplicativos que dominam décadas mas depois desaparecem, comunidades que crescem exponencialmente e depois viram memória...
 
Pois é... Se há uma verdade sobre a internet é que ela é dinâmica e fluida: aberta à novidades e mudanças severas. O que vem por aí? Ninguém sabe. Então é bom ficar atento. Estar aberto ao futuro, mas sem esquecer do passado; eis a obrigação do internauta inteligente. E sigamos, que a vida cultural online não pode parar.