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29/02/24

Notas de Leitura: O Discurso Sobre a Servidão Voluntária





Bons amigos costumam nos encaminhar aos bons livros. Ou, pelo menos, colaboram para nosso regresso a eles. Pois, dando mostras de amizade, Wanderson Duke intimou-me a ler e comentar o "Discurso sobre a servidão voluntária". Fez isso sem saber que eu já conhecia e já apreciava o opúsculo. Tenho-o na estante e por duas vezes já me detive em sua leitura. Como eu já pretendia relê-lo, acatei sem demora a proposta do amigo. 

Agora, cumprida a tarefa da leitura, venho cá registrar meus comentários. Por didatismo, julguei oportuno antecedê-los com contextualizações, fazendo as ideias acessíveis a quem ainda não leu a obra.

O autor do Discurso

Etienne de LaBoetie foi um humanista francês que viveu no século XVI. De família rica, La Boetie, assim como outros humanistas do Renascimento, foi latinista, grande conhecedor dos clássicos antigos, das vidas e das ideias dos povos gregos e romanos. Sabe-se que escreveu seu opúsculo ainda muito jovem, talvez antes dos dezoito anos. Faleceu cedo, aos trinta e três. Dos textos que nos deixou, o mais traduzido, importante e conhecido é o Discurso Sobre a Servidão Voluntária. 

Foi amigo próximo do filósofo Montaigne, tanto que, em seu testamento, legou a ele os seus escritos. Anos mais tarde, para honrar a memória do amigo, Montaigne publicaria o Discurso. E desde então, geração após geração, ele vem sendo republicado.

O gênero literário do Discurso

O gênero da obra de La Boetie é o Discurso Escrito, uma modalidade de exercício retórico e ensaístico comum aos eruditos franceses de outrora. Gênero que seria muito usado por filósofos iluministas. Jean Jacques Rousseau, por exemplo, escreveria um dos discursos mais famosos, garbosamente intitulado: "Discurso Sobre as Origens e os Fundamentos da Desigualdade Entre os Homens".

Existe, portanto, na obra de La Boetie, uma sensibilidade retórica. Nota-se nela a eloquência que tanto marcou o estilo da época: os parágrafos são longos e densos, com muitas inversões sintáticas e ostentação erudita no manejo dos pronomes.

As principais ideias do Discurso

O caráter retórico do texto não lhe retira o caráter ensaístico; isto é: o autor deseja apresentar um conjunto de questões, problemas, ideias e categorizações que julga relevantes.

Quanto as ideias apresentadas, são três as maiores realizações do Discurso Sobre a Servidão Voluntária: primeiro, expõe o que autor entende por servidão voluntária; segundo, estabelece suas principais causas e consequências; e, terceiro, traça a relação do tirano com sua corte. Essas três operações intelectuais formam o triângulo mestre do esquema de raciocínio do autor, e é em torno desse triângulo que orbitam suas outras reflexões. O resto do que se discute na obra tem feição de digressão ou complemento (prova disso é que o autor, por duas vezes, reconhece ter escapado ao tema).

Eis, a seguir, um resumo da obra:

La Boetie começa demonstrando perplexidade diante da tirania monárquica, situação política em que milhares de homens se dobram aos caprichos de um só. Se liberdade é melhor que sujeição, como explicar que tantos homens tenham se rendido aos mandos de um só?

O autor argumenta que, para tantos súditos, seria muito fácil obter a liberdade. Bastaria que cessassem de obedecer ao tirano. Caso o povo optasse pela recusa à obediência, o tirano não teria mais poder algum, nada podendo fazer contra ele. A não desobediência indicaria, portanto, algo errado: revelaria uma estranha aceitação. O povo, por algum motivo, aceita o tirano, sendo a sua servidão voluntária.

Procurando explicar as origens dessa servidão voluntária, La Boetie diz que os povos nascem livres, mas, geralmente por força da guerra, são obrigados a organizar exércitos e seguir a voz de comando de um líder. Após a guerra, esse líder terá adquirido tanto prestígio entre o povo que se fará rei, prometendo ser, como rei, mais protetor do que era como general. Estruturado o reino, criam-se as leis e as dinastias. O povo acostuma-se a obedecer as leis, e com o passar das gerações vai perdendo a memória dos tempos em que era livre. Quanto mais obedece, mais tirânicos e poderosos se tornam os reis.

O primeiro motivo da servidão voluntária seria, então, o costume. O povo obedece porque seus antepassados obedeciam, porque assim lhe foi ensinado. Não haveria no homem instinto de liberdade que não pudesse ser mitigado pela educação.

Porém, por mais obediente que fosse o povo, sempre haveria riscos de sublevação de alguns de seus membros. Para evitar isso os tiranos utilizariam o incentivo aos jogos, ao sexo, às festas e a outros entretenimentos populares, prazeres baixos que entorpecem, hipnotizam e distraem as multidões. O povo é facilmente manipulado e o tirano sabe disso. O segundo motivo da servidão seria, assim, a permanência do povo num estado de distração fútil, prazerosa e festiva, que levaria, segundo La Boetie, à covardia e efeminação.

A terceira e mais importante causa da servidão voluntária é atribuída aos interesses egoístas dos estratos que orbitam o poder e com ele se beneficiam. La Boetie exemplifica dizendo que seis conselheiros cercam o rei, apoiando-o em troca de favores; e esses conselheiros, por sua vez, são cercados cada um por cem oportunistas que os apoiam em troca de favores; e cada um desses cem é cercado por outros mil subalternos, que reproduzem o mesmo padrão. Essa pirâmide de sujeição e apoio em troca de favores termina sempre por legitimar o poder do rei, mas ao custo de gerar muitos conflitos de interesse, visíveis nas intrigas da corte, onde todos fingem respeito, mas, pelas costas, conspiram e tramam uns contra os outros. Assim a tirania seria aceita porque, para muita gente, ela é lucrativa.

Ao expor as causas da servidão o autor intercala considerações sobre o comportamento dos tiranos. Diz que se diferenciam quanto a forma de obter o poder: uns o alcançam pela eleição, outros pela dominação bélica e outros pela sucessão hereditária. Mas se há diferença na origem, não há na condução do poder, de modo que, ao exercerem a tirania, assemelham-se todos. Fala também das relações entre o tirano e sua corte, demonstrando que aqueles próximos ao rei aceitam uma vida miserável regida por desconfianças, incertezas, suspeitas e paranoias, pois nem o tirano confia neles e nem eles no tirano. O comum é que os amigos do rei de hoje sejam os enforcados de amanhã, e o rei paparicado hoje seja o tirano emboscado amanhã. A vida na corte seria, assim, um verdadeiro inferno.

La Boetie conclui dizendo que as classes que sustentam o tirano deveriam despojar-se de sua mesquinhez, e que o tirano, se não for punido pelos homens, será por Deus.

Os Comentários Deste Leitor

É fácil ver nas palavras de La Boetie aquele espanto que jovens idealistas demonstram ante as injustiças do mundo. Ao escrever contra a principal forma de organização política de seu tempo, analisando e questionando a sujeição do povo, parece ter ele inaugurado a tradição do humanismo social politizado que, nos séculos seguintes, marcando a cultura letrada francesa, produziria grandes mobilizações e mudaria para sempre a França, a Europa e o mundo.

De fato, os temas do opúsculo, e outros relacionados ou derivados, foram calorosamente debatidos e politizados após La Boetie. No plano filosófico, Rousseau criticaria a desigualdade; no econômico, Saint Simon criaria o Socialismo; na ação política, a emergente burguesia destronaria a nobreza na Revolução Francesa (inaugurando a Idade Contemporânea e toda sua idolatria pela República); e com Marx e seu comunismo o povo ganharia uma teoria revolucionária radical, que prometia, se efetivada, eliminar toda opressão entre classes. Todos esses esforços posteriores, além de reafirmar a importância das questões colocadas no opúsculo, aprofundaram as análises propondo soluções políticas.

Mas tudo isso é passado e história feita. Se é fácil ver a importância de suas ideias no curso da História, que dizer sobre essas ideias  nos dias de hoje? Qual a utilidade delas na realidade brasileira? A quem, e em que, elas seriam úteis? 

O leitor informado sabe que, nos meios politizados de hoje, especialmente na esquerda contemporânea, fala-se muito sobre a opressão ao povo ou a certos subgrupos do povo. O grave defeito dos que costumam defender tais ideias é a extrema demagogia com a qual raciocinam e se manifestam. O povo, ou o subgrupo escolhido, é tratado como cordeiro imaculado, ente sacralizado, isento de pecado e da possibilidade de erro, privado de qualquer responsabilidade sobre seu próprio destino. Toda crítica que recebe é encarada como fruto de preconceito, ódio ou mal sentimento. Pois os que assim raciocinam, supondo que possuem mesmo algum pensamento crítico, são os que mais deveriam ler o Discurso Sobre a Servidão Voluntária. La Boetie demonstra que além de ser possível criticar a conduta do povo, é apenas fazendo isso que conseguiremos compreender como se dá a perpetuação do poder.

A idolatria ao oprimido é um fenômeno oposto ao antigo padrão da esquerda. Na esquerda clássica, marxista, a alienação do povo, sua passividade e docilidade eram bem conhecidas. O pilar do projeto político marxista era a conscientização da classe trabalhadora. Apesar da simpatia aos pobres, sabia-se que, para o progresso, era preciso educa-los. Não havia, de modo algum, a adulação inconsequente que domina hoje entre os nossos progressistas. Os comunistas soviéticos chegaram a debater se a classe trabalhadora seria realmente capaz de conduzir a revolução, com alguns comunistas considerando que não, que seria a classe intelectual o agente revolucionário por excelência.

A esquerda brasileira hoje parece apostar nas duas visões ao mesmo tempo: por um lado seus intelectuais procuram influenciar os universitários pregando a existência de meia dúzia de teorias críticas que, segundo eles, elevam a consciência e a inteligência; porém, por outro, negam apaixonadamente que um homem culto é mais inteligente que o padeiro, dizem que a cultura erudita (aquela mesma que estudam e na qual seus heróis, Marx, Freud e Foucault, foram buscar suas bases) é opressão eurocêntrica, e chegam a sugerir que oferecer ao padeiro uma educação clássica, como a que o intelectual teve, é uma forma de opressão ou eurocentrismo. Trata-se de uma duplicidade esquizofrênica e indigesta. Quero crer que a leitura do Discurso Sobre a Servidão Voluntária, que ficaria ainda mais fortalecida com a leitura das obras do contemporâneo Theodor Darymple, vá produzir algum movimento crítico na cabeça de quem se deixou levar pela demagogia tão em voga.

Lembremos, pois, das palavras de La Boetie

"...Na realidade, a natureza do povo, cujo número é sempre maior nas cidades, é ser desconfiado com quem ama e sincero com quem o engana... É uma coisa maravilhosa que cedam tão logo, mas somente se os elogiarem. Os teatros, jogos, farsas, espetáculos, lutas de gladiadores, animais estranhos, medalhas, quadros e outros tipos de drogas, eram para os povos antigos os atrativos da servidão, o preço da liberdade, as ferramentas da tirania. Os antigos tiranos possuíam este meio, esta prática,estes atrativos, para iludir os súditos sob seu jugo."

23/08/23

13 Intelectuais Importantes Para Compreender a Direita Brasileira




Luís Inácio Lula da Silva é, novamente, o presidente da República Federativa do Brasil. Com ele no cargo, a centro-esquerda keynesiana, nacional desenvolvimentista, neoidentitária e "politicamente correta" volta ao poder.

Para os que se interessam por filosofia política, história, cultura e erudição; sejam de esquerda ou de direita; vale, para sair do cercadinho do jornalismo atual, marcado por palavras de ordem e ideias feitas, conhecer ao menos as principais obras e ideias dos grandes críticos da esquerda brasileira.

Vale conhecer suas teorias espiritualistas, morais, economicistas, históricas, sua visão social, política, suas vidas, suas filiações, seu estilo de pensamento, sua argumentação e suas mudanças de pensamento. Importa porque quem bebe na fonte tem informação qualificada. Quem tem informação qualificada pensa melhor. Quem pensa melhor, entende mais.

Conhecimento básico e honesto dos autores abaixo ensinará as diferenças e conflitos entre liberalismo, conservadorismo e fascismo; entre reacionários e conservadores, entre tradicionalistas e liberais, entre antisionistas e sionistas, entre liberais clássicos e liberais progressistas, entre capitalistas e fascistas, entre integralistas e nazistas, etc.

Aqui no Brasil infelizmente o comum é que "professores doutores", "historiadores", "sociólogos" e "intelectuais" que dão aulas em universidades não saibam essas coisas.

O meu leitor, caso queira, pode saber delas e de muito mais. Ser ignorante é uma escolha possível, e tem sido a preferencial do brasileiro, mas os meus amigos e leitores são pessoas inteligentes, que valorizam o próprio cérebro e o conhecimento que ele pode adquirir. Gente curiosa e que procura pensar com independência crítica.

Dito isso, eu recomendo que, havendo interesse, leiam e analisem as ideias, o pensamento social, cultural, econômico e político de:

1 - Machado de Assis

Deixe a careta de lado. Calma, eu explico: não sendo propriamente um autor de teoria política, Machado de Assis era monarquista, eurófilo e culturalmente elitista. A visão da psicologia do brasileiro e da cultura brasileira que ele expressa em seus livros é negativa, pessimista. O sentimento de que nosso comportamento é vicioso, precário e hipócrita, cheio de bajulação a autoridades, de conformismo, de mediocridade... Tudo isso vai compor um ceticismo social que é muito caro a crítica conservadora.

2- Gustavo Barroso (Historiador, Integralista)

O Barroso, historiador muito erudito, escreve aquelas "verdades proibidas" sobre o império bancário e o poder sionista. É autor pra ler "escondido", mas que não se pode deixar de ler.
3- Plínio Salgado (Integralista)

Líder de um dos movimentos políticos mais interessantes e nacionalistas que já existiram no Brasil. Misturou ideias do fascismo, do trabalhismo, do socialismo cristão e do integralismo português, rejeitando o materialismo capitalista, o racismo europeu e o comunismo soviético. Buscava a ideia de integrar os aspectos humanos fragmentados nas teorias políticas ( o homem não é apenas sua raça, o homem não é apenas um servo do Estado, o homem não é apenas um indivíduo, ele é tudo isso, num todo orgânico, cheio de tensões e condicionantes. É, portanto, necessário uma "teoria integral do homem", que não o reduza a um condicionante particular arbitrário).Trata-se de uma síntese muito original e interessante, e que hoje, pela indigência mental da intelectualidade dominante, é lida como "fascismo/nazismo". Quando na verdade era justamente uma crítica construtiva a essas e outras correntes.

É, obviamente, outro autor pra ler "escondido".
4- Nelson Rodrigues (Conservador, "reacionário")

Como pode um pervertido como o Nelson - "anjo pornográfico", como o chamou Rui Castro - ser um conservador? Ele não foi o único. Hilda Hilst, Marcelo Mirisola, Leon Bloy e Ewelyn Waugh, que escreveram coisas horríveis e pérfidas, eram todos católicos. Por hora, não revelarei. Mas os motivos são pra lá de interessantes.

5- Carlos Lacerda (Liberal-conservador, udenista)

Dizem que é um dos maiores canalhas da história do Brasil. Eu não sei. Mas sei que era um homem muito eloquente. Ex comunista e maior inimigo de Getúlio Vargas, foi um dos responsáveis pela crise que levou ao suicídio do pai dos pobres.

Além de eloquente, era corajoso. Em plena crise de 64, antes que os militares de direita tomassem o poder, enquanto tudo era rumor de que haveria um golpe de militares da esquerda, ocupou o Palácio da Guanabara e desafiou o General esquerdista cotado para dar o golpe:

"General Aragão, general Aragão, não se aproxime, porque eu te mato com o meu revólver!".

E mais: homem de cultura, traduziu "The Roots Of Coincidence", do Arthur Koestler. Livro muito interessante e que é um dos livros preferidos do Alan Moore.

6- Paulo Francis (Conservador, crítico cultural)

A melhor prosa do jornalismo brasileiro. Referência fundamental. Bom representante da elite carioca: na juventude foi da contracultura, do teatro e um dos fundadores do jornal O Pasquim (com Ziraldo, Millôr e outros). Perseguido pela Ditadura, mudou-se para os Estados Unidos. Vivendo lá, conheceu a liberdade individual do liberalismo e encantou-se. Deu uma guinada e assumiu-se conservador. Foi um escândalo. Tretou com gente da esquerda e da direita. Tirava o sono do Caetano Velozo. Sempre muito espirituoso, informativo e divertido.

7- Olavo de Carvalho (Neocon, sionista, crítico cultural)

Chorem os mais sensíveis, mas o Olavo é importante. Basta olhar pro Bolsonarismo e pra multidão de macaqueadores dele pra saber o tamanho de sua influência.

Recomendo a trilogia noventista - A Nova era e a Revolução Cultural, O Imbecil Coletivo e O Jardim das Aflições, porque tem um vasto panorama de crítica a movimentos culturais relevantes no mundo e no Brasil, e que continuam ecoando, aparecendo ou ditando os debates por aqui. Entre os três, o mais importante é O Imbecil Coletivo, porque demonstra os chavões presentes na retórica esquerdista acadêmica e a indigência intelectual de alguns de seus representantes.

Certamente um autor pra ler "escondido". O que evitará importunação da esquerda e da direita. Ler criticamente o Olavo te garantirá o ódio dos esquerdistas, por tê-lo lido, e o ódio dos direitistas, por tê-lo criticado. Vá sem medo: é um autor bem engraçado, com uma veia satírica talentosa, aliada a um espírito de porco primoroso e uma língua muito mais do que viperina. Leon Bloy tupiniquim.

8- Diogo Mainardi (Liberal, crítico cultural)

O Diogo, espécie de filho bastardo do Paulo Francis, não é profundo e nem é rigoroso. Mas diz verdades. Escreve com a sinceridade que só os debochados conseguem. A mentalidade da classe média alta, com seus preconceitos, preferências e ideias feitas, cristaliza-se nele de forma quase caricata: é ateu, liberal, anglófilo/eurófilo. Além disso, ele escreve bem, seu estilo é muito divertido.

9- José Guilherme Merquior (Liberal, crítico cultural)

Génio das humanas, é, ao menos em alguns de seus livros, o autor mais difícil desta lista. Cada parágrafo seu é um caldeirão de referências culturais, históricas, literárias e teóricas. Os intelectuais de esquerda reclamaram que ele citava livros demais, e por isso seria "pedante". Era, pelo contrário, um leitor assombroso, a ponto de impressionar Claude Levi Strauss e Ernest Gellner. O ensaio crítico que ele fez sobre Foucault é pra ler e reler.

10- Eduardo Giannetti (Liberal)

Clara, rigorosa e analítica, a prosa do Giannetti me lembra um pouco a do Bertrand Russel. Não é por acaso: Giannetti morou na Inglaterra, estudou e foi professor em Oxford. É um liberal ponderado cujo racionalismo iluminista é assombrado pelo ceticismo. Tensão muito interessante e curiosa. Giannetti diz não acreditar que as pessoas levem as ideias a sério. Tem, inclusive, um livro a respeito (O Mercado das Crenças), mas nem por isso deixa de escrever livros. Sinal de que talvez ele acredite nas ideias.

11- João Pereira Coutinho (Liberal - conservador)

Português radicado no Brasil, o JPC é outro que faz o estilo intelectual europeu. Só que muito pior, porque ele é europeu mesmo. Analítico e ponderado, é um dos principais nomes da direita liberal não histérica.

12- Oswaldo Meira Penna (Liberal- conservador, analista de psicologia social)

Diplomata erudito com formação junguiana e ampla experiência internacional . O livro dele sobre a psicologia social do brasileiro - Em Berço Esplêndido - é indispensável, e obra pouco conhecida na vida intelectual universitária.

13- Enéas Carneiro

Poucos homens públicos no Brasil foram tão honestos, inteligentes e apaixonados pelo Brasil como o professor Enéas Carneiro. Ex militar, herdeiro do positivismo, o homem era um gênio. Médico cardiologista com trabalhos de referência, era também professor de matemática, física e química. Homem que ascendeu pelo estudo, Enéias era disciplinado, firme e atribuía valor e responsabilidade aos cargos ocupados por autoridades. Interessado mais do que tudo na soberania brasileira, criou um partido para "reedificar a ordem nacional". Naturalmente, pelo discurso moralista, tom autoritário, estilo caricato e inteligência elevada, foi rejeitado pela mídia liberal e também pela esquerda.

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É claro que o natural complemento dessas leituras são os tradicionais nomes de esquerda: Jorge Amado, Florestan Fernandes, Glauber Rocha, Luis Schwartz, etc. Eu recomendo ler os críticos da esquerda quando ela está no poder e ler os críticos da direita quando ela está no poder, porque é na ação concreta do poder que os aspectos mais negativos saltam aos olhos.

É, sim, um esforço intelectual. Não é desumano, mas também não é desprezível. Aprende-se mais com essas leituras do que se aprende nos cursos de História, Jornalismo e Sociologia atuais. Aumenta em muito a capacidade de compreender a complexidade da vida intelectual nas ciências sociais. Ajuda a entender a importância do polemismo e do ensaísmo, da crítica cultural.

Se o leitor fizer o mesmo processo com autores de esquerda, terá um rico arsenal de referências e fundamentos para analisar as opiniões veiculadas em nossa mídia e criticá-las com propriedade.