23/11/23

Os Cavaleiros da Supervia


Benditos sejam esses meninos
Negros, morenos e favelados
Ousados e destemidos
Que numa noite de Sexta-Feira
Empinam bicicletas coloridas
Nos corredores estreitos
Dos trens cinzas da Supervia

Acordam passageiros adormecidos
Fazem caretas de zombaria
Não temem os vigilantes
Sabem escapar aos fiscais
Meninos espertos e anarquistas
Sonham e nos ensinam a ousar

Com invejável equilíbrio
Tecem proezas no desporto
Como hipistas da nobreza
Ou cavaleiros medievais
Dominam seus cavalos modernos
Feitos de pneus, correntes e ligas de metais

Pouco se importam
Com a apatia do mundo
A vida para eles
Carece de aventura
Brilham esses meninos
Com sua poesia urbana
Sintetizada em ato de vida
Poesia in loco, espontânea

Digo aos meninos
Que são a Gangue dos Empinadores
Eles sorriem, orgulhosos
Depois descem todos na mesma estação
E se reúnem em roda, deliberando
Esta noite, para onde vão?
Que molecagens? Que glórias?
Que descobertas?
Que censuras receberão?

Despeço-me deles e reflito
Penso que não sei viver e não vivo
Nasci velho, cansado, Matusalém enrugado
Mas me inspira essa descoberta incrível
A visão da glória da vida
Neste lugar tão distante de tudo
Sabem viver esses meninos
Negros, morenos e favelados
Ousados, felizes, anarquistas

16/11/23

Lágrimas e Saudades


Ela que não morresse
"Preciso ainda de ti", ele afirmou
Ela lacrimejava, pois não queria partir
Mas engoliu o choro e lhe disse
"Da morte não se pode fugir"
 
Ela estava viva
Cambaleante e fraca
E sofrendo muito
Mas estava viva
 
Até que num 2 de Setembro
Veio o seu último dia
Quando então ela partiu 
Diante da família
 
Lembro-me de sua meiguice
E também de sua fé
Lembro-me de seu sorriso
E também de seu abraço
Lembro-me de tudo
E sinto saudades, e choro

09/11/23

O Apelo do Poeta

  

Moça bonita e fogosa
Que me lê a poesia e a prosa
Faz feliz este poeta
Que mesmo pecador
Quer unir-se ao divino
 
Mostra-me teu paraíso
Que tem lugar bem definido
Está de mim afastado
Bem aí, no teu corpinho
Em recinto entrincheirado
Logo abaixo do teu umbigo...
 

02/11/23

Desfile de Ébano

Negras e amorenadas
Nas quebradas a desfilar
Os cabelos black power
O estilo sarará

Andam cheias de marra
Elevadas pelo empoderamento
Deixam de lado a altivez e sorriem
Quando as elogio o embelezamento

Os corpos muito diversos
Cheios de talentos vários
As bundas, bem torneadas
Os seios, arredondados

Variam elas também
Em tipos de personalidade
Algumas são megeras
Outras são raridade

Algumas apreciam poetas cínicos
Românticos e pervertidos como eu
Outras preferem ascetas
Homens honrados e de Deus

Noto que algumas condenam
Meu apreço à beleza sinuosa
Dizem que meu olhar as oprime
E que não devo enaltecer suas formas

Calo-me então e nada digo
Mas calado fico a imaginar
Aquela morena, meu Deus, toda nua

Vênus a me fascinar!


26/10/23

Minha Aristocracia

Não um rei na barriga
Mas uma corte inteira
Em tumultuoso escarcel
O trono usurpado
Pelo revolucionário menestrel
 
Uma outra aristocracia
Jamais vista até então
Poetas, místicos e filósofos
Vagabundos e anarquistas
No controle da situação
 
Amor, virtude e sacrifício
Eis a ordem do dia
Fazei da tua conduta
O poema mais sublime
A mais bela sinfonia
 
A minha aristocracia
Antes desconhecida
Aqui eu lhes apresento 
Sejam meus súditos leais
E hão de viver a contento

18/10/23

Divina Mente Vazia


Coração romântico
Cabeça filosófica
Combinação maldita
Que só traz a derrota
 
Pensar, não mais!
Buscarei o silêncio
A mente vazia
Oficina do demo
 
Ditado idiota 
Pois nada há que se assemelhe
A tão divina magia
Que é fechar os olhos
E limpar a própria mente
 
Coisa de Deus
E não do Diabo
Pois ao Senhor pertence
O nome mais sagrado
O "yod-he vav-he"
Que na quietude se ouve
Sem ser pronunciado

09/10/23

Estranhíssima Trindade


Habitam em mim 

um bobo

um sábio 

e um bruto


A maioria tolera o bobo,

porque diverte

Alguns toleram o sábio, 

quando ilumina


Já o bruto não é tolerado,

pois aterroriza:

Carrasco, 

filia-me aos perversos

e me escandaliza ante os puros

Acorrenta-me:

a uma espiral de paixões lunares

guerras gratuitas

e devassidões dos sentidos


Quero ceder, devo lutar

Bem maior

supremo e sagrado

É a alma

Coisa linda é ter uma

Mas, infeliz a minha,

porque, fracionada


E mesmo assim

frágil, muito frágil, 

tenho alma 

Sagrada, gloriosa

transcendente

É por ela que continuo, e luto:

Cresça em mim o sábio

ou o bobo;

nunca, jamais, o bruto.


16/09/23

Não Era O Que Parecia





Pessoa que até a véspera nos tratava amigavelmente. Sorria, falava. Demonstrava interesse em manter conosco a boa relação, e depois surpreendeu virando a casaca: riscou o fósforo do desencontro para acender a dinamite do silêncio. O efeito, uma explosão de energia negativa. Antes, sua conversa receptiva sugeria uma conexão que, no futuro, continuasse tudo constante, daria em agradável amizade. 

Ser humano a quem nos abrimos, e a quem procuramos ajudar, aceitando com zelo o autoimposto dever do amigo. Imaginávamos, é claro, ser de confiança. E ao revelarmos elevada disposição afetiva, esperávamos tudo, até que risse de nós, os românticos do afeto; o que não esperávamos nunca é o gratuito desdém, o desprezo, a falta de consideração.

Diante de tamanho descaso, que podemos fazer? Como em tudo o que não podemos mudar, deve-se aceitar o ocorrido e refletir, buscando compreender o que de fato aconteceu. E, claro, aprender a evitar esse tipo de situação no futuro.

Eu sei, nós sabemos: há instabilidade no comportamento humano. As pessoas mudam: crenças, atitudes, ideias e sentimentos. Há em cada um de nós caprichos, defeitos, idiossincrasias, preconceitos, ansiedades e sentimentos não declaráveis. Algumas pessoas são mais volúveis, outras mais estáveis.

Vale entender que é possível uma relação muito agradável sem que exista de fato uma amizade. Isso porque, via de regra, as pessoas não expressam diretamente a desimportância que podem dar a alguém que consideram divertido, agradável, inteligente e gentil. Sem expressar verbalmente, tendem a demonstrar em atitudes negativas; descumprindo acordos e não honrando as próprias palavras. Também as pessoas não se revelam por completo. Podem mostrar uma coisa e pensar outra. Ao tratá-las de forma agradável e amigável, elas tendem a responder de igual forma, o que não implica, necessariamente, em amizade.

O amigo é aquele que já conhecemos o suficiente para nele confiar. O amigo é definido pelo grau de confiança, previsibilidade, cumplicidade e experiência que temos com ele, não pelo tamanho de nossa atração ou disposição afetiva. Não importa o quão elevados sejam nossos sentimentos por uma pessoa. Por mais querida que ela seja, nosso sentimento isolado não é suficiente para compor amizade. O que importa é o modo como ela nos trata: se nos valoriza ou não. Se nos valoriza e respeita, como a valorizamos e respeitamos, então a relação vale à pena. Se nos trata com desdém, o melhor é nos afastarmos.

Esse desapego afetivo pode ser doloroso, mas exercê-lo é se livrar de uma dor ainda maior: a que viria caso tivéssemos alimentado a relação, pois estaríamos nos iludindo, e quanto maior o apego, maior a frustração. Fato é que nem todos que apreciamos podem nos conceder a atenção e estima que precisamos. Eis o mundo como ele é. Portanto, quando percebemos que alguém de quem gostamos não nos valoriza, é mais inteligente desapegar e se afastar o quanto antes. Não é apenas questão de orgulho, mas de saúde mental e moral. A regra é simples: não existe amizade sem reciprocidade.

É nas atitudes que reconhecemos quem são as pessoas confiáveis, que devemos incluir como amigos, e quem são aquelas que, embora eventualmente agradáveis, não se importam de verdade conosco. O discurso mascara, mas as atitudes revelam. Aquele que nos diz "sou teu amigo", mas não age como tal; é sempre traiçoeiro e perigoso, porque fomenta em nós expectativas que jamais se poderão concretizar. Mais leal é um verdadeiro inimigo, que deixa claro a sua indiferença e não cria conosco uma relação dupla, mostrando uma face e agindo com outra. Vale mais esse inimigo franco que um amigo aparente.

Encontramos na vida pessoas cordiais, receptivas e agradáveis que parecem amigas, mas que, na realidade, são autocentradas, desinteressadas, desdenhosas e no fundo fazem de nós pouco caso. Quando não somos maliciosos e desconfiados, caímos na armadilha das aparências e nos deixamos levar, imaginando termos ganho uma boa relação. Chega cedo a primeira frustração e vemos que fomos enganados, que não eram por dentro o que pareciam por fora. Nesse momento, é hora de sorrir, lembrar que as aparências enganam, erguer a cabeça e continuar em busca de melhores relações.

A vida afetiva é um imenso garimpo: com paciência encontra-se o precioso, mas não vem sempre e não vem fácil; há sempre percalços no caminho. Como já dizia o bardo: "nem tudo o que reluz é ouro".

30/08/23

Uma Verdade Desanimadora Sobre Debates

 Querem saber uma verdade desanimadora que aprendi? Foi sobre debates.

[Sabem o que é isso? É um circo, é um Show de Horrores, é um atentado à inteligência. É qualquer coisa, MENOS um debate]


Aprendi que, em geral, não é a pessoa mais virtuosa, melhor informada e com a razão que vence o debate. Quase sempre é o contrário: quase sempre é o vigarista, o demagogo, o manipulador e o trapaceiro, ou o lado menos informado, quem vence.

Isso acontece por vários motivos, alguns naturais, outros artificiais.

Antes de tudo, é preciso compreender que um debate real e sincero só pode acontecer em determinadas condições específicas; quando uma certa conjunção de fatores é satisfeita.

Alguns dos principais fatores necessários para um debate verdadeiro são:

  • Profundidade adequada (exigência intelectual) – Ambos os debatedores devem compreender e tratar o problema com o nível de profundidade necessário. Se estão a falar, por exemplo, de um tema que está em debate a milhares de anos, com farta literatura, fartos debates anteriores, fartas polêmicas e muitas sutilezas, eles não podem tratar o tema com leviandade ou com simplificação rasteira. Exemplo: debates sobre a existência de Deus, sobre a maldade humana, sobre a função do Estado, etc.
  • Honestidade (exigência moral) – Ambos os debatedores devem buscar: a) a verdade; b) uma conciliação entre duas opções; ou c) a opção menos danosa (o mal menor). Se um lado deseja manipular a opinião pública, defender um grupo de poder específico, defender uma agenda política, provocar desinformação, desestabilizar uma classe, acusar o outro lado... Então não haverá de fato um debate, mas apenas um pseudodebate; que será usado para manipular a opinião pública sobre determinado assunto. (95% dos “debates” televisivos são dessa natureza, e ainda acrescidos dos fabulosos recursos da edição).
  • Paridade/ nivelamento (exigência comparativa) – Ambos os debatedores devem ter um nível mínimo de conhecimento sobre o tema para poderem analisá-lo de forma satisfatória. Isso inclui, certamente, o conhecimento do que já foi dito e pensando ao longo da história sobre o assunto, especialmente nos níveis mas elevados. O requisito mais básico e primário para se discutir qualquer tema é estar bem informado a respeito. Nunca, em hipótese alguma, deve-se levantar um debate sobre ideias, fatos ou temas sobre os quais não se tem um conjunto robusto ou mínimo de informação e contexto. Se um debatedor souber muito mais que o outro, ou souber de pontos importantes que o outro não sabe, o debate é precarizado; e o tempo que seria usado para debater o ponto em questão, será usado para informar a outra parte; o que faz a coisa virar uma aula e não um debate.
  • Privacidade/ localidade adequada (exigência de meio adequado) – Em vista das três exigências acima, o debate deve ser travado num local ou meio que permita o pleno cumprimento desses requisitos. E esse local não é a TV, menos ainda o rádio, menos ainda o Youtube. Primeiro porque aqui no Brasil não há cultura do debate racional; então, para começar, as pessoas não fazem nem idéia de como debater sem xingar umas às outras ou mesmo sem partir para a agressão. Segundo porque o brasileiro não é um leitor minimamente variado e inteligente; o que significa que ele perde toda a informação contextual, histórica, científica e analítica que os livros divulgam e aprofundam. (Em geral o brasileiro lê sobre temas espirituais, auto ajuda, sexo e ficção, quando muito, lê sobre política). E terceiro porque a platéia física favorece o manipulador. De fato, o bom manipulador pode praticamente ignorar o debatedor adversário e jogar para a platéia; já que o público é bem fácil de ser manipulado. Daí que os meios adequados para certos debates acabam sendo, quase sempre, os livros e as revistas especializadas. As vezes os jornais; e em alguns casos eventos promovidos em universidades e outras entidades culturais (como o debate entre Chomsky e Foucault).

[Na cena cultural/ intelectual brasileira (e mesmo mundial) tem tanta gente que merece esse selo…]


E mesmo no contexto literário e universitário, a maioria dos debatedores mais famosos são, em certo grau, falsários e manipuladores. Chomsky, por exemplo, é oposição controlada do lobby sionista, enquanto Foucault era agente do lobby pedófilo (se alguém se chocar com essas alegações é sinal de que está mal informado). Então, em questões políticas, o discurso de ambos se mistura com pontuações filosóficas válidas e estratagemas retóricos que visam sustentar interesses ocultos, jamais declarados.


Os debates honestos, rigorosos e que apresentam uma discussão profunda e pertinente, respeitando todos os critérios e exigências necessárias, na maioria das vezes são considerados chatos e enfadonhos para o público médio. Isso pode ser facilmente percebido pela ojeriza instantânea que o brasileiro médio nutre diante de Filosofia e Matemática; duas áreas que consistem basicamente em trabalhar com definições essenciais, critérios, lógica, conjuntos de possibilidades, provas e demonstrações. Ou seja: reflexão aprofundada e exigente.

Além disso, existe um outro problema, relativo à própria natureza do conhecimento e da inteligência, que implica numa realidade assombrosa: em geral, quanto mais um cientista ou pesquisador descobre um aspecto essencial e verdadeiro da realidade, mais difícil é transmitir essa descoberta, com profundidade, na linguagem comum. Quase tudo que é essencial de se saber exige uma terminologia adequada, daí que os antigos falavam de “linguagem sagrada” e nós, modernos, falamos de linguagem técnico-científica e "operacionalização".

No vídeo abaixo, Richard Feynman, um dos maiores físicos e intelectuais do século passado, dá uma ótima explicação sobre esse problema linguístico/epistemológico.


A linguagem comum raramente presta para transmitir verdades profundas. E esse é um dos motivos do porquê escritores trabalharam a linguagem, em termos estéticos e estruturais, para tentar transmitir verdades ou princípios essenciais. (Esse também é o motivo pelo qual os antigos educavam seus filhos com mitos, símbolos, ritos e alegorias.)

Então, temos um fenômeno muito interessante, que acontece com um monte de gênios: o sujeito passa a vida inteira buscando descobrir a verdade sobre um tema, e quando descobre; percebe que ou não será compreendido, ou só será compreendido por muito pouca gente. Nesse momento, muitas vezes, ele acaba se isolando, como foi o caso do Grigory Perelman, do Ludwig Wittgenstein e de tantos outros.

Em geral, é por causa disso que gente como o Olavo acaba ganhando tanto destaque. Dizem, por exemplo, que o Guru da Virgínia é o maior filósofo do Brasil, enquanto ignoram a existência de Newton da Costa ou o trabalho de gente como Vicente Ferreira da Silva e José Guilherme Merquior. Embora todos eles tenham sido filósofos de fato, na mais elevada expressão do termo, com contribuições significativas ao corpo do conhecimento humano e da história da filosofia, inclusive com reconhecimento internacional de seus pares, o trabalho deles é muito exigente, praticamente inacessível ao homem comum; que não é dado a grandes reflexões. Na verdade, o nível deles é tão elevado que mesmo a maioria dos professores universitários os desconhece.

Em suma: a razão acaba ficando com quem sabe convencer e persuadir, não com quem está certo ou com quem realmente entende o assunto. Por isso, num mundo dominado pela propaganda e pela superficialidade, o poder pertence aos charlatães, mentirosos e manipuladores.

Aprenda a mentir e manipular e o mundo será seu. Ou, ao menos, aprenda a se defender de mentirosos e manipuladores.

26/08/23

Um Apelo aos Leitores


Olá, caro leitor. Você curtiu e aprendeu com aquele meu texto? Espero que sim, porque escrever, reescrever, editar, pesquisar as imagens, pôr as imagens, pesquisar os links e pô-los aqui dá trabalho. Se você achou útil ou interessante, compartilhe com algum amigo ou conhecido que possa se interessar. Se você aprendeu algo, compartilhe, não guarde apenas com você. 
Compartilhando e trazendo leitores para o blog você incentiva a produção de textos mais elaborados.

Em outros tempos este tipo de apelo não seria necessário, porque a qualidade dos textos do blog naturalmente atrairia leitores, mas hoje a atenção das pessoas está concentrada nas redes sociais, nos aplicativos e nas plataformas de vídeos. Isso acaba obscurecendo este e outros blogs que podem ajudar jovens interessados em cultura e formação intelectual. 

Então você, leitor consciente e camarada, tenha boa alma e ajude este blogueiro em crise: inscreva-se no blog para receber novidades por e-mail e compartilhe o que considerar compartilhável. Mais que isso eu não te peço.