Contaram-me de uma donzela das Letras que tem por qualidade roubar livros na Bienal.
[O desafio de xadrez mortal, em Harry Potter e a Pedra Filosofal*. A vez em que o Ron Weasley salvou todo mundo, mostrando que era mais esperto e nobre do que todos suspeitavam.]
Contarei a vocês sobre como o xadrez me fez aprender ao menos duas lições essenciais, que me forneceram maturidade para a vida inteira:
Como todo mundo do nosso tempo, eu fui educado para pensar que "todo mundo é igual" e que "todo mundo" possui os mesmos potenciais, inteligências e habilidades. Em outras palavras; fui infantilizado por A.O.E.C's (Agentes Oficiais do Emburrecimento Coletivo, vulgo "professores") para ignorar Verdades Fundamentais da Biologia, como a variação das habilidades entre os indivíduos e a desigualdade na distribuição dos dons, níveis e tipos de inteligência.
Isso me fez acreditar, de forma absolutamente inocente e tola, que eu poderia virar um Einstein ou um Kasparov, pois era apenas uma questão de treino e esforço.
Foi jogando xadrez que eu aprendi que os A.O.E.C'S haviam me enganado.
O que aconteceu? Já conto. Mas antes, como fazem os sábios, já aviso: Senta que lá vem história!
Aprendi xadrez, junto ao meu irmão, aos doze anos. Aos dezesseis, cansados de jogar apenas entre nós, eu e o mano decidimos procurar outros enxadristas locais. Então descobrimos, no Orkut, que havia uma comunidade de xadrez na cidade. Rapidamente entramos em contato com os sujeitos e, previsivelmente, nos tornamos amigos e rivais.
Logo montamos um grupo. E todo final de semana, religiosamente, estavámos na praça, disputando nossos torneios, treinando novas aberturas, novas estratégias e trazendo novos desafiantes ao grupo. Tendo também muitas conversas inelectualmente estimulantes, misturadas com todo tipo de zoeira, trollagem juvenil e conversas sobre mulheres.
Em casa, jogava contra meu irmão (que quase sempre ganhava). Nossas disputas pessoais (quando não eram resolvidas no tapa) eram resolvidas racionalmente com base no resultado das partidas. Também jogava com desafiantes e amigos na escola. Então, para mim, era uma atividade muito presente.
A consequência natural foi me interessar por campeonatos. Naquela altura, eu sabia que poderia sair do nível amador e me tornar um jogador razoável, e começava a cobiçar a possibilidade de me tornar um G.M (Grande Mestre) - um enxadrista respeitado em nível internacional (sim, eu era ambicioso!).
[Bobby Fisher, lenda do xadrez mundial, ao ser questionado se ele achava que era o melhor jogador do mundo, respondeu placidamente:"sim, eu sinceramente acho que sou o melhor jogador de xadrez vivo dos nossos tempos". Duas semanas depois da entrevita ele conquistou o título de campeão mundial.]
Você acha que todo mundo pode ser tão bom no xadrez quanto ele? Que é só treinar? Então porque outros jogadores treinaram tanto quanto, mas não conseguiram os mesmos resultados?
No campeonato da minha cidade, achei que ficaria em primeiro lugar, então convidei o Ezequias, um amigo que era um pouco melhor, e que morava no município vizinho, para participar do torneio também. Os outros participantes, por melhor que fossem, eu sabia que poderia ganhar. O Ezequias estava "uns dois degraus" acima de mim. Embora já tivesse ganho dele, sabia que seria um desafio.
A final do torneio não deu outra: eu contra ele.
Numa jogada genial, eu tomei a dama. "Pronto, agora eu ganho!" foi o que pensei. E daí em diante, como me é típico, comecei a relaxar. Mas meu rival era entendido de tática e estratégia; e, muito orgulhoso, não iria desistir fácil. Ezequias pensou um bocado e conseguiu, numa jogada ainda mais brilhante, me dar um xeque-mate totalmente inesperado e imprevisível.
Fiquei em segundo lugar. Mas sabendo que poderia ter ganho, que tive uma vantagem e vacilei. Engoli a seco, mas o que eu poderia fazer? Ezequias era um bom jogador. Se eu quisesse ter ganho, deveria ter sido mais cuidadoso, mesmo com a vantagem. Foi um bom jogo, desafiador, instigante e justo. E ficar com o segundo lugar nem era tão mal assim.
[Henrique Mecking, o "mequinho", maior enxadrista brasileiro de todos os tempos. Esteve entre os top 10 do mundo. Depois de uma partida contra ele, que acabou em empate, Bobby Fisher - A LENDA - disse: "Eu achei que iria perder!"]
Você acha que é "todo mundo" que consegue dar um susto enxadrístico no Bobby Fisher?
Meu município era pequeno e não tinha tradição alguma em atividades mentais. Então eu e minha gangue enxadrista migramos para o campeonato da cidade vizinha. Esse torneio já era um pouco mais significativo, e os resultados nele nos fariam ver o quão habilidosos nós realmente éramos, já que vários enxadristas de toda a região iriam participar.
No dia do campeonato, descobrimos que o vice campeão de xadrez do Rio de Janeiro estaria por lá. Incrível! Finalmente eu poderia ver um sujeito de nível elevado jogando.
Agora, preciso dizer a vocês que nesse torneio eu empatei com um jogador extremamente experiente, um senhor que era o professor de uma escolinha de xadrez da cidade. Foi empate por tempo. Segundo o professor, eu fiz apenas uma jogada errada. É claro que ele iria me ganhar e que tudo que eu estava fazendo era postergar o xeque-mate. Porém, considerando que se tratava de um amador, "de rua", contra um jogador experiente, um mestre local, posso dizer que postergar o jogo o suficiente para chegar a um empate por tempo foi um resultado bem interessante. Até hoje esse empate é o resultado do qual mais me orgulho, e guardo com carinho a notação da partida (depois tiro uma foto e posto aqui).
Já o Ezequias, que era o melhor de nós, foi jogar contra o "o vice-Rio". Entendam bem, caros leitores: o Ezequias, em nível amador, era um bom jogador. Tinha várias aberturas, saídas e movimentos, incusive de meios e finais, decorados e exercitados. Mesmo assim ele foi absolutamente massacrado pelo vice-Rio.
Eu nunca tinha visto ninguém normal prever tantos movimentos. E olha que já tinha jogado com ótimos jogadores, que tinham boa resposta para cada jogada minha. Era óbvio que aquele cara era fora do comum. Enquanto meu amigo Ezequias estava explodindo o cérebro e se matando de raciocinar, aquele cara, aquele maldito gênio, estava simplesmente brincando. As jogadas que nós considerávamos brilhantes eram nada menos do que cócegas para ele. Cócegas, amigos! Cócegas em pés de um gigante!
Eu havia acabado de empatar com um jogador já idoso e, embora altamente experiente, normal. Mas aquele cara, o vice-Rio, só a experiência e treino não explicava a habilidade dele; havia algo mais, algum tipo de habilidade inata, específica, para a coisa. O treino dele só reforçava e ampliava essa habilidade. E era uma habilidade que nem eu, nem meus amigos, nem o mestre local e nem nenhum dos outros jogadores ali tinha, simplesmente não era uma habilidade de raciocínio comum.
Então, talvez pela primeira vez na vida, eu pensei:
"Posso até estudar muito e ficar muito bom, mas nunca vou ser como esse cara. Nunca vou ter a facilidade, a velocidade de raciocínio e a memória absurda que ele tem. O filho da puta é um gênio!".
Exatamente o mesmo sentimento que o Vegeta teve nesse dia:
[Hindenburg Melão Júnior, superdotado brasileiro, enxadrista com recorde no Guiness por ter vencido a maior simultânea do mundo de xadrez às cegas. Ou seja: jogou contra vários enxadristas profissionais SEM OLHAR PARA O TABULEIRO. E ganhou.]
E você, o que me diz? É todo mundo que consegue isso? É só treinar? Ou é preciso algum tipo de habilidade computacional e mnemônica inata, além do treino?
Depois, ao longo da vida, conheci pessoalmente alguns gênios, alguns superdotados, alguns "aspies" e algumas pessoas com alto QI. E tive sempre a mesma percepção, de que estava diante de um talento natural.
Aquele dia no campeonato foi apenas a primeira vez; e como tal, foi marcante e inesquecível. Desfez o emburrecimento que os AOEC'S haviam induzido em mim.
Nunca mais confiei em professores. Se alguém é incapaz de reconhecer um aspecto óbvio - elementar- da realidade, e o falsifica, então esse alguém não é cognitivamente confiável para mais nada, o que o torna totalmente inepto para o ensino. Até hoje, 90% dos professores que conheci eram desse tipo- o que me fez detestar a escola.
Mas não é bem culpa deles: é um fenômeno da modernidade/pós-modernidade negar a realidade em função de necessidades psicológicas e sociais. Assunto sobre o qual irei falar em outra resposta.
Se eu tivesse comprado essa balela de que "todo mundo é igual, com a mesma inteligência", eu estaria até hoje tentando, sem sucesso, ser um enxadrista tão bom quanto o Bob Fisher ou o Magnus Carlsen. Estaria infeliz e deprimido, sem saber aceitar minhas limitações e provavelmente nunca teria descoberto minhas habilidades naturais, que são outras.
[Samuel Reshevsky, com apenas oito anos, em 1920, derrotando mestres de xadrez na França.]
Você acha que toda criança é - ou pode ser - igual a esse guri?
Por outro lado, com o tempo, descobri que era muito mais habilidoso em escrever do que em jogar xadrez. E de fato, várias pessoas já me disseram que "tenho o dom". Não sei se é dom, mas realmente sinto que nasci para escrever, que é uma vocação, que tenho algum jeito para a coisa. E embora eu ainda tenha que melhorar MUITO para ser um bom escritor, posso dizer que escrever "é o meu negócio", como dizem os gringos.
Então, três coisas posso dizer para vocês: jamais confie 100% em seus professores, especialmente se algo na sua experiência pessoal - ou intuição- contradiz diretamente o que eles alegam. Segundo: saiba reconhecer quando alguém é superior a você em algo, e terceiro: busque sempre saber no que você é bom. Se fizer essas três coisas, você vai conseguir:
Hoje, por exemplo, eu sei que se não treinar muito pesado e muito consistentemente durante anos, não terei a mínima chance de vencer um enxadrista mediano.
Mas não me ressinto disso, porque sei que com meus textos, posso chamar a atenção para a história do xadrez, para os seus benefícios, para as biografias dos grandes mestres e para a beleza e grandiosidade do jogo que ao mesmo tempo é arte e guerra. E com isso posso despertar o amor e o interesse das pessoas pela Arte de Caíssa.
Esse é um prazer que eu teria perdido se tivesse ouvido o populismo de meus professores e de outros demagogos.
***
Nota do editor: Assim como outros textos deste blog, a obra acima foi originalmente publicada como resposta no site Quora
É difícil sugerir um método categórico, universal e que se aplique a cada caso particular, pois as pessoas não possuem as mesmas habilidades e facilidades.
Contudo, pela minha experiência, diria que um bom começo é justamente essa consciência: refletir sobre como o processo de aprendizagem funciona para você, em que contextos ele ocorre de forma mais eficiente e mais prazerosa.
Em outra palavras, é preciso se questionar: O que você aprende com mais facilidade? Que tipo de assunto? Por qual tipo de abordagem? Você precisa de uma referência visual para entender bem um tópico (o famoso "quer que desenhe")? Ou prefere uma abordagem histórica? Quando diante de um professor, você prefere a voz de um homem ou de uma mulher? Prefere estudar de dia ou no silêncio da noite? Prefere estudar em grupos ou sozinho? Em sala de aula ou fora dela?
Muito do processo do autodidata consiste numa adequação dos meios e formas de ensino às suas preferências e habilidades. O termo de ordem aqui é personalização do processo. Quanto mais ativo você é no seu processo de aprendizagem, mas natural ele se torna para você. Já experimentou fazer uma lista com os temas ou problemas que mais te interessam e depois passar um tempo investigando os melhores livros, vídeos e áudios básicos a respeito? Pois esse é um bom começo!
Existe uma série de coisas que as pessoas aprendem espontaneamente ao longo da vida, isso porque aprender é uma habilidade natural.
Dito isso, devo enfatizar que a base do autodidatismo está num imperativo moral de autorresponsabilidade. Por que esperar que a informação chegue até você, via professor ou curso, se você tem os recursos e a inteligência necessária para ir atrás dela? É antes uma questão de amor ao conhecimento, de respeitar sua curiosidade, de amar a atividade investigativa e de ter brio. Se algo realmente te interessa, é você quem deve correr atrás!
Claro que isso não significa que você vai ser capaz de aprender tudo sozinho, sem interferência externa ou sem a ajuda de alguém que entenda melhor o assunto. Autodidatismo não é isso. A rigor, ninguém aprende nada sozinho (mesmo quem aprende majoritariamente por livros está aprendendo com outra pessoa: o autor). Tudo o que você deve fazer é pesquisar e gerenciar as fontes de informação e sua interação com elas. Decidindo quais são as melhores para você e em que contexto você vai utilizá-las, estabelecendo uma ordem nas atividade, etc.
Nesse processo, você deve usar como arma as habilidades que já possui. Sua memória é boa? Ótimo, considere isso em seu sistema, não tenha pudor em memorizar esquemas.
Sua memória não é tão boa, mas você gosta muito de ler e é muito paciente? Ótimo, procure as melhores fontes básicas nos livros e as explore até dominar o conteúdo.
Você não tem nenhuma grande habilidade, mas é do tipo competitivo que faz qualquer coisa quando é desafiado? Pois bem, escolha algum sujeito metido mais inteligente que você, numa matéria que você sente que pode melhorar, e só pare de se dedicar ao assunto quando superá-lo ou for, no mínimo, tão bom quanto ele.
Outra coisa necessária para começar é ter um meio de medir o seu progresso e domínio no assunto. É possível fazer isso por meio de provas e exercícios, conversando ou debatendo com especialistas, escrevendo e dando aulas sobre o tópico em questão e, claro, produzindo algo com aqueles conhecimentos (se forem conhecimentos técnicos/ práticos). O melhor sistema de checagem é o que inclui todos esses.
Dê uma olhada neste vídeo: nele um dos maiores intelectuais do século passado fala um pouco sobre o processo de educação autodirigida:
Para resumir, as dicas básicas para começar a se tornar um autodidata são:
Isso é só um início, mas deve ajudar.
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Dica originalmente publicada no site Quora, em 25 de Junho de 2019
O primeiro Jorge Amado a gente nunca esquece. Pois bem, no exercício de ler e conhecer ao menos uma obra dos grandes prosadores brasileiros, depois de me impressionar com a prosa do Carlos Heitor Cony, resolvi conhecer alguma coisa do nosso grande populista Jorge Amado. Populismo esse que para o crítico Wilson Martins era um pecado e que para mim não é - ao menos não necessariamente...
Tenho pretensões literárias, culturais e intelectuais: alguns livros para terminar de escrever, ao menos uma editora para criar e muitos livros para traduzir.
De experiência, tive alguns contos e crônicas publicados em blogs e revistas literárias online, algum flerte com fanzines, alguns artigos opinativos espalhados pela internet, e performances literárias variadas em ambientes virtuais variados. Blogs, já os tive aos montes. No mínimo, uns treze. Mas eu chutaria uns quinze.
[Jack Kerouac tendo um orgasmo literário. Quem nunca?]
Passei em duas universidades públicas federais, sendo que uma delas é considerada uma das melhores do Brasil. Sem cursinho e sem sequer ter estudado muito. Tudo isso, em parte considerável, pelo peso das redações - e em outra parte pela cultura humanística que adquiri como autodidata. No vestibular de uma dessas instituições - uma das melhores e "mais difíceis" universidades do país- minha nota de redação foi 9.9.9.8. Ridículo, não é mesmo? Nem ostentar um dez eu consigo!
Já fiz mulheres inteligentes se apaixonarem por mim, com textos. Já fiz moças lindas se encantarem por mim, com textos. Já troquei e-mails com amigos, de forma recorrente, promovendo debates, durante alguns anos. Já fui convidado para escrever em site de amigo e até em revista de intelectual acadêmico. Ah, e já interagi e conquistei a atenção - as vezes até o respeito - de colunista famoso da Folha e de gênio de elevado QI com registro no Guiness.
Por meio dos meus textos, consegui a admiração de uma quantidade significativa de gente extremamente inteligente e brilhante. Gente com uma inteligência que provavelmente eu nunca vou ter. É tentador citar os nomes das pessoas que já me elogiaram (por que algumas delas são de enorme relevância para o cenário intelectual e cultural brasileiro) mas mesmo assim não o farei. E por que? Bom, porque sei que, embora tenha melhorado muito desde que começei a escrever, embora tenha vivido algumas coisas das quais me orgulhe, tenho a plena, visceral e tortuosa consciência de que estou longe, MUITO LONGE, de ser um bom escritor.
Escrever, eu escrevo, só não escrevo bem!
Todos os elogios que recebi servem muito bem para me motivar a continuar escrevendo e mostrar que estou no caminho certo, mas nenhum deles vai melhorar minhas habilidades literárias: e é isso o que me interessa.
Sendo assim, mesmo sem ser um bom escritor, acho que, dada essa leve bagagem, posso te deixar algumas dicas que me ajudaram muito.
Vamos lá:
Por hora, vou deixar as dicas apenas para quem quer dar uma melhorada no texto. Outra hora repasso algumas dicas para quem quer ser escritor, viver de texto e de livro (algo que eu ainda não consegui, mas que devo conseguir num futuro relativamente próximo).
Notem que determinadas dicas serão mais úteis para determinadas pessoas. Mas, de início, eu recomendaria que se investisse em cada uma delas. Selecione as que achar mais apropriadas e anote-as.
#1 Você não precisa ser um expert em Gramática
[Antonio Houass. Esse cara sabia tudo, só não sabia escrever]
Dica contra intuitiva? Talvez! Mas extremamente verdadeira. E é especialmente verdadeira no meu caso. Alguém entendido em português e gramática sente calafrios na alma ao ler meus textos, já que estão atulhados de erros.
Se isso é verdade por um lado, por outro é verdade que o conteúdo, a didática, a clareza e o bom (ou mal) humor chama a atenção. Então, existe esse aspecto, não formal e qualitativo, do texto; que se relaciona mais às ideias, ao ritmo de condução e encadeamento das mesmas do que à correção.
Claro: sem um domínio mínimo, elementar, de pontuação, sintaxe, regência, ortografia, colocação pronominal, tempos, modos verbais e demais ferramentas, você não faz muita coisa. E meu ponto é justamente este: domine ao menos o básico, o resto você melhora com o tempo, a prática, o estudo e com a ajuda dos mestres.
Não espere dominar a língua primeiro para depois escrever. Essa é a maior besteira que alguém pode te falar, pelo simples motivo de que você só domina alguma coisa quando a pratica exaustivamente. Se você não praticar os usos, aplicações e características do idioma em seus textos, como é que vai se tornar um bom escritor? Seria como tentar ser bom jogador lendo livros sobre a natureza do futebol e não praticando o esporte.
Acredite em mim: o futuro de todo formalista é virar um gramático ou crítico literário que não é lido por nenhuma pessoal normal, ou então um lexicógrafo ranhoso e pedante. Nesse sentido, cabem aqui as palavras de Millôr Fernandes sobre Antônio Houaiss (que, embora fosse um dos maiores eruditos da língua, era considerado mal escritor):
"Houaiss conhece todas as palavras da língua, ele só não sabe juntá-las"
Não vá me entender errado: não estou dizendo para abandonar os manuais, estou dizendo para não ficar apenas neles. É preciso estudar E praticar.
#2 Faça experimentações psiquico-literárias.
[O grande segredo que os escritores não te contam: escrever é fazer lavagem cerebral no leitor]
Essa dica é um complemento da anterior. Você deseja que seus textos sejam lidos e produzam algum efeito na sociedade ou ao menos em seu leitor, certo? Pois, para isso, você precisa conhecer não só o seus textos, mas os leitores disponíveis. Muitas vezes, para alcançar um público maior, você precisará simplificar vocabulário, modulando e adequando a linguagem e o conteúdo ao nível do ouvinte. Logo em seguida, conforme desperta a curiosidade dele, pode ir elevando-o para patamares e elocubrações mais sofisticadas.
Mas antes você precisa de leitores. Então não tenha medo de agradar, de provocar, de chocar. Atraia leitores. Escreva sobre o que o brasileiro gosta: putaria, sexo, futebol, novela, política, piada, fofoca. Mas escreva sob sua ótica, dê o seu ponto de vista, seja honesto, seja falsificado, seja polêmico. Eu odeio futebol e falo mal dele vez ou outra. Mas falo de futebol citando Nelson Rodrigues e Lima Barreto, ou seja: se a pessoa não conhece nada de literatura, mas gosta de futebol, eu já expando o universo dela, e expando para dentro do meu mundo, que é o mundo literário.
Escrever, em grande parte, é seduzir pessoas para o seu mundo mental, emocional, intelectual e filosófico. Também é invadir sutilmente a mente dos outros e plantar lá as suas ideias, ou deixar a sementinha delas. É entrar lá e corrigir perspectivas, ampliar horizontes, desfazer nós cegos que maus professores e educadores ajudaram a dar.
Em suma, o escritor é muito mais poderoso do que comumente se pensa. Mas antes ele precisa ser lido! Então aprenda a chamar a atenção e angariar leitores.
Faça textos para amigas, para professores, para seus pais, para blogs, para o facebook, para o Wattpad, para o Medium. Vá em eventos, organizações, escreva cartas para escritores ou blogueiros, enfim. Vá criando redes com leitores e escritores. Estudando como reagem aos seus textos, se adequando ao público de um nicho para depois roubar e conduzir esse público ao seu nicho.
#3 Não se deixe abater pela crítica especializada
[Olha, se não é um crítico da Folha/FLIP! Aposto que sei o que ele está pensando: "Hum…como vou citar o Philip Roth no meu artigo de amanhã sobre essa exposição cubo-dadaísta?"]
"O que é um crítico de arte? É um artista frustrado!"
Esse é um bordão malicioso, mas contém alguma verdade. Em geral, como todos os intelectuais, os críticos tendem a se agremiar em Torres de Marfim para ficar exaltando seus autores favoritos:
"Olha esse novo romance do Philip Roth, meu deus, como ele é bom!"
Ass: crítico literário qualquer da Folha de SP.
Raramente eles param para olhar o que se passa lá em baixo, entre o povo.
Eu conheço um bocado de gente que é leitor voraz, inclusive de literatura, e nunca conheci na vida alguém que lia Philiph Roth. Mas que lia Paulo Coelho e Augusto Cury eu conheci um monte.
Na verdade, Paulo Coelho e Cury só ficaram tão grandes justamente por que a crítica especializada não dava atenção nenhuma para eles. Você já conheceu gente normal que dá ouvido a críticos literários? Não existe. Gente normal gosta de resenha de blogueiro, lista da Amazon, Buzzfeed e literatura modinha.
Enfim, não queira escrever para agradar intelectual, nem para agradar professor. Escreva para comunicar algo que você acredita relevante, que tenha a ver com seus valores ou que produza no leitor os comportamentos e pensamentos que você julga apropriados e saudáveis, ou que apenas conte a história que você quer contar.
#4 Mostre seus textos como dançarinas de funk mostram a bunda.
[O que é bonito é para se mostrar, o que é feio também!]
Mostre seus textos, sem pudor, para amigos mais cultos, mais intelectualizados e com maior bagagem literária. Eles lhe darão os feedbacks mais produtivos. Se conseguir angariar o elogio do leitor comum e deles, vais estar no caminho certo.
#5 Aprenda com os melhores/ Seja humilde
[Seja um eterno aprendiz dos gênios. No seu caso, dos literários]
Faça um monte de amigos mais fodas que você, cerque-se de gente melhor que você em tudo, e seja minimamente humilde para aprender com todos. Gente inteligente e culta adora falar e ensinar o que aprendeu. Ainda mais num país em que as pessoas fogem de livro e de reflexão como o diabo foge da cruz
#6 Seja Eficiente
[A famosa poesia-porcaria]
Poesia? PARA A PUTA QUE PARIU COM A POESIA!
Grande parte do que se chama poesia hoje são textículos vagabundos sentimentalóides que fazem joguinhos de palavras. E quer uma novidade? Isso não impressiona ninguém! Qualquer mocinha de 13 anos que tenha sentimento romântico e um Minidicionário Aurélio faz isso.
Poesia de verdade é um treco difícil para cacete. Tem métrica, exige um domínio desgraçado da sintaxe e das figuras de linguagem. Esse treco que o pessoal faz é, no máximo, peido poético: a expressão de um sentimento genuíno que a preguiça intelectual impediu que se transformasse em algo realmente impressionante.
Comece pela prosa. Aprenda a ser claro, a distinguir bem o significado da palavra. Tenha bagagem semântica, filosófica, lógica, gramática. Quando você souber usar o básico dessas ferramentas, aí sim pode começar a brincar com as palavras e tentar torcer o idioma expressivamente.
Mas antes disso, sem recursos, seria como tentar construir uma casa só com tijolos. Não dá: precisa de argamassa, cimento, telhas, sapatas, vergalhões, janelas, portas, etc.
#7 Jamais seja comedido
[Pavonei-se sempre que for conveniente. Se você tem algo a oferecer: exiba!]
Eis aqui um grande segredo que aprendi com o Ray Cruz, um amigo poeta underground que infelizmente não se encontra mais entre nós. Que é:
"Transforme-se em um personagem, antes que a sociedade faça isso com você"
As pessoas gostam de personagens. E entendem as coisas melhor por meio de caricaturas. Então saiba abusar disso, dos clichês. Você acha que o Bolsonaro seria eleito se não endossasse o mito do Comunismo Onipresente? Não, não seria. Olavo de Carvalho, Rodrigo Constantino e vários outros autores ficaram anos moldando o imaginário popular com a ideia de que todos os setores culturais no Brasil estavam dominados por Comunistas.
Se você for sensato, comedido, justo, ninguém vai te ler. Seja radical, bata em todo mundo, fale mal de gente famosa, você quer ser lido, ou não? (Até hoje o meu texto mais comentado é o que eu dou pancada carinhosa no Olavo.)
Claro, é possível fazer contraposições e ataques com classe, estilo, ironia e sofisticação. Com o tempo, você pode aprender a fazer críticas pesadas, mas extremamente pertinentes, com um humor absolutamente genial. Quer um exemplo? Deixarei quatro:
Por hora, é isso. Leiam meus textos, me sigam, acompanhem minhas dicas, me façam boas perguntas, corrijam meus erros nos comentários, me escrevam cartas de amor, de ódio, me xinguem nos comentários, me mandem propostas indecentes inbox, me deem um emprego.
Me façam rico e bem sucedido, e então eu escrevo um livro com tudo o que sei ("TODOS OS SEGREDOS DA VIDA, DA ARTE, DA FILOSOFIA, DO SEXO E DA RELIGIÃO - VOLUME ÚNICO- especial para antigos amigos, leitores e colaboradores do Quora) só para vocês.
Abraços,
especialmente nas leitoras
:)
Li a notícia de que um menino europeu de doze anos derrotou um Grande Mestre de Xadrez e não contou a ninguém de sua classe, simplesmente porque não queria se gabar.
O que me livrou do suicídio não foi Deus, o Amor, a Família ou a Esperança, mas sim a Burrice. Minha perfeita, gloriosa e abundante burrice.
E se ela não gostasse? Meus amigos gastronômicos achavam maravilhoso, eu adorava, não conhecia quem reclamasse, mas... e se ela não gostasse? Ela cozinhava, parecia entendida. Talvez fosse chata com comida. Será? Tarde demais, porque já estávamos sentados esperando o yakisoba do china.